SABORES >> Sergio Geia

 


Hoje pensei, vou começar assim: 
 
Esta crônica fala de gostos, sabores e saberes. 
 
Mas depois pensei que não era um simples pensamento: já era decisão. Então pensei de novo que deveria começar. E comecei, aliás, já havia começado. 
 
Talvez mais de gostos do que de sabores ou saberes, e pensei de novo que talvez pudesse mudar o começo e até o título. É que no fundo, talvez, gosto tenha a ver com sabor. Mas no fundo mesmo, um pouco além do simples fundo, tudo tenha a ver com saberes. Estou confuso hoje, admito. Mas me sinto feliz, e adoro esse jogo de palavras. 
 
Comprei uma vitrola, mas isso todos já sabem, assunto velho, jornal embrulhando peixe. Vinha ensaiando. Anos. Tenho vinis guardados desde o tempo do onça e queria ouvi-los. Então fui ouvir e um problema surgiu. Grave. Gravíssimo. Decepção. Alguns bons, mas a maioria dos vinis era impossível de se ouvir. Não. Não me peça. Não vou citá-los porque até automutilação literária tem limites. Pensei. Na verdade, penso: ou meu gosto musical mudou muito nesses anos ou eu tinha um péssimo gosto musical. 
 
Tudo bem. O que importa é que ontem acordei cedo disposto a abastecer minha despensa de vinis e pôr a vitrola para trabalhar. Fui ao beco. Não. Não beco, assim, com letra minúscula. Fui ao Beco do Disco, na Souza Alves. Contei para o André minha decepção. Ele me ajudou. Trouxe delicadezas e preciosidades. E um especial. Dire Straits – Brother in Arms. Capa azul, um lindo céu, uma guitarra prateada. Disco que só pelo side one já vale a pena. E Your Latest Trick que ouço agora, que me embala a escrever. E a beber, claro. Uma dose de uísque, hoje, com sabor especial. 
 
A crônica de hoje fala de gostos, sabores e saberes. Talvez mais de gostos do que de sabores ou saberes. E fala também de um momento de pura felicidade. Pura mesmo, não é clichê. Límpida, inocente, efêmera, talvez até tosca, mas felicidade. 
 
 
P.S.: 1. Ilustração: Pixabay; 2. Your Latest Trick, para ouvirmos juntos. 
 
 

 
 
 
 

Comentários

Jander Minesso disse…
Meu pai costuma dizer que só o estúpido não muda de opinião. Acho um pouco agressivo mas, ao mesmo tempo, dá carta branca para desgostarmos de antigos gostos e vice-versa. E, pra mim, essa crônica foi uma delícia de ler! Logo eu, que sempre achei o sax da Your Latest Trick meio cafona, me pego assoviando o dito cujo agora. Só me falta começar a gostar de Dire Straits.
sergio geia disse…
Assovie o dito cujo. Faz parte... Da mudança rsrs Abração, meu amigo.
Anônimo disse…
Texto que me instiga a comprar uma vitrola, mas ainda estou na fase do Matchbox. O guitarrista do Dire, assim como o Benjor, toca guitarra com os dedos em posição de aranha. É engraçado. O Benjor já falou sobre isso em várias entrevistas. André Ferrer aqui.
Zoraya Cesar disse…
que delicadeza. E q coincidência vc e NadiaBella falarem sobre a decepção q dá às vezes qd olhamos o passado e vemos q aquilo q nos encantava nao faz mais sentido.

your latest trick é obra prima.

Agora, vc deve a seus leitores fieis quais foram esses discos kkkkkk
Albir disse…
Estou quase convencido por você a comprar vitrola e garimpar LPs nos sebos. Mas ainda falta coragem.
Por enquanto basta uma busca no Google para ouvir a música desejada. O problema é que já ando esquecendo de quais músicas desejar.
Soraya Jordão disse…
Gosto muito da forma com que as músicas embalam suas crônicas.
sergio geia disse…
Grato, André, Zoraya, Albir e Soraya. A música tá na minha vida mesmo, Soraya. Comprar uma vitrola foi uma das coisas mais deliciosas que fiz este ano, Albir. Se a vontade é grande, não resista. Tenho dúvidas, Zoraya, tem muita porcaria kkkkkk; não me reconheço (melancolia aqui). Que legal, André, essa história do jeito de tocar a guitarra; não conhecia.

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