OFÍCIO >> Whisner Fraga
às vezes penso na frivolidade da escrita,
sobretudo quando me sento diante da tela e tento, imaginem!, trabalhar,
mas há uma cidade inteira morta: são carlos, foz do iguaçu, ou imperatriz,
chegar até uma cidade inteira morta, mais de duzentos e cinquenta mil corpos,
desprotegidos, expostos, desarmados,
é concebível?,
alguns amigos, como se estivessem nesta cidade inteira morta:
enio,
sr. dimas,
mortos nesta cidade inteira morta,
aí tento rabiscar algo, a mão hesita, não quer, não precisa,
a mão, as mãos, se adaptam à cabeça, como se ela precisasse de apoio,
e precisa,
badernam o cabelo que nem penteio mais,
e a única palavra que balbucio é vergonha,
ou medo, ou catástrofe, ou desgraça, ou saudade,
mas uma de cada vez,
tento escrever um conto:
vergonha medo catástrofe desgraça saudade
vergonha vergonha vergonha vergonha vergonha
uma cidade inteira morta, helena,
e só posso chorar estes mortos.
Comentários
Apesar de triste, seu texto ficou maravilhoso.
Chorar pelos que agonizam, em casa, nas ruas e nos hospitais.
Chorar pelo ainda vivos, os amedrontados e os irresponsáveis.