ENVELHECENDO >> Sergio Geia
Pois não é que fui parar num pronto-socorro?
Meio sem vontade, claro; aliás, quem vai com vontade a um pronto-socorro? Mas imaginar
aquela parafernália toda, a demora, e, geralmente, o resultado, que é quase
sempre previsível, pelo menos pra mim, já me serve como um bom desestimulante ou
uma boa terapêutica, vai, remedinho da hora pra me deixar novo em folha. No
entanto, o dia foi passando, o sol mudando de lado e eu nada de melhorar. De
café da manhã, uma maçã; de almoço, uma pera.
No caminho
fui fazendo o diagnóstico (eu sempre faço isso): vômito + diarreia + calafrio + desânimo + dor abdominal
= intoxicação.
A minha única
dúvida era saber a causa. Primeiro pensei nuns salgadinhos que eu tinha comido numa
festa sábado à noite. Depois, num frango à parmegiana que tinha comprado no
sábado, pra comer no domingo. Por fim, o excesso de estrogonofe do almoço de
domingo. Tem também aqueles que falam que não foi a comida, mas eu mesmo que
não estava num dia bom, pois é. Mas a vilania mesmo, depois de pensar muito,
eu entreguei a esse chocolate dos deuses da indústria brasileira: o Ouro Branco.
De quinta a domingo, se não errei a conta, comi uns 25.
Comentário 1. Tá bom, eu reconheço, foi demais. Acontece que
hoje, com 48, qualquer coisa que eu coma fora de contexto, e fora de contexto
quer dizer tudo o que não seja um arrozinho, feijão, grelhados, saladas,
legumes, já causa um terremoto na minha barriga. Antigamente eu chegava meia-noite
em casa, comia um x-tudo, depois dormia como um anjo. Não precisa dizer. Eu sei.
O tempo passou.
Pois não é que fui fazer xixi e a
urina saiu vermelha? Sangue. Parecia uma cerveja bock. Primeiro pensei se tinha
comido beterraba. Pensei em hepatite (eu já tive hepatite na infância), infecção
de urina, pedra nos rins. A recomendação que dei a mim mesmo naquele momento (eu sempre faço isso) foi
beber água, muita água, um caminhão-pipa. E a urina foi clareando, clareando, clareando,
até normalizar. No dia seguinte, pela manhã, ela voltou vermelha. Fiz a mesma
coisa. Ela normalizou, e já faz dias que está normal. Mesmo assim, procurei um
médico. Tô fazendo exames. Já vi que na urina, as hemácias estão elevadas;
leucócitos também. Amanhã faço um ultrassom dos rins e das vias urinárias. Hoje
estou sentindo um desconforto na bexiga que vai e vem.
Pois não é que acordei com
uma mancha nas costas? Assim do nada, de coisa nenhuma, tal como aparecem as
dores, o torcicolo, o espirro. Dormi com as costas limpas, acordei com ela
manchada. De repente, a mancha se instalou na omoplata e lá ficou; gostou das minhas
costas. Uma nuvem escura no céu da minha costela. E como o PSDB, não há nada
que a faça desembarcar.
Meio
arroxeada, ligeiramente escura, e coça. No começo não liguei. Fiz pouco caso,
mesmo porque o incômodo era risível. Achei que fosse como mais uma dessas
insignificâncias que aparecem, e tão rápido como aparecem, somem. Não foi o
caso. Já fui a três médicos, até biópsia quiseram fazer. O diagnóstico que
deram é que não é nada, apenas uma inofensiva manchinha. É da idade, disse-me
um deles. No máximo uma pomadinha pra aliviar a coceira e, quem sabe, dar uma
ligeira clareada.
Pois não é que outro dia eu não arriei o cóccix?
Não conseguia fazer yoga, nem andar de bicicleta, uma simples encostada na parede
eu já tremia de dor. Nos exames, nada. Segui as prescrições e nada. Com o tempo
a dor sumiu. Misteriosamente. Só que eu já tinha ido num clínico geral, num
urologista, num proctologista (não me pergunte o que eu fui fazer lá, ok?),
nuns dois ortopedistas, muitos exames pelo caminho até chegar ao cóccix.
Comentário 2. É triste, amigo. E inexorável. A
não ser que as ideias do Aubrey de Grey comecem a vingar logo, as visitas a médicos, hospitais, laboratórios, clínicas,
farmácias, ocuparão cada vez mais um espação na nossa corrida pela vida.
Pois não é que fui comer um
amendoinzinho e o dente quebrou? Enchi um copo de cerveja...
Ilustração: Vincent
van Gogh
Comentários
Mas preciso confessar um prazer em me identificar em seu texto, em não estar só ;)
beijo