RAROS PRAZERES [Sandra Paes]

Sim, gosto das tempestades. A força da natureza ali manifestada dessa forma sempre me acorda e me faz lembrar minha própria natureza, presa, contida em um corpo que parece limitar meu espirito que gosta de voar e navegar em tantas paisagens jamais vistas.

A vida ali oculta me chama, hoje - sempre... Acho que flerto com a morte
porque ela, guardiã de portais de transições, vem brincar comigo. Vira meus
sonhos de perna pro ar, me mostra fatos ainda por vir, e sussurra docemente em
meu ouvido cada vez que leva alguém consigo pra esse outro mundo, do outro lado
de outros horizontes.
Sim, tudo alem do alcance da vista comum, ocupada por papeis ridículos,
documentos que nada documentam, e toda essa forja nada plutônica que a
burocracia do mundo ainda insiste em sustentar como regra maior de convívio entre os homens e suas culturas.

Todo tempo é meu, todo
beijo é sempre seu, porque sela de forma especial o amor que nem reconhecemos.
Sim, porque amor não se encontra, se reconhece. E isso é o maior de todos os
prazeres - reconhecer o amor, que como a morte, brinca de viver com você
comigo, e nos testa na ousadia maior da vida: pegá-los!
Essa tempestade que se anunciou só pra mim, só pra mim mesmo ou para aqueles que a desejam tanto, se deu somente dentro de mim, no mundo de meu
sentir.
Há lá fora um sol que brilha aquém das nuvens que ocultam os mistérios que em mim querem se fazer nus. Há o mesmo corredor entre as portas. O mesmo ar soprando pelas ventanas
do teto. Há um instante de sei-la-o-que, silencioso como o olho do furacão que
se revela poderoso só pra quem o contempla sem medo.
Em nosso céu la nave va. Espera... A bonança está pra chegar em breve. Prazeres raros sempre se dão entre raios que até se passam entre neurônios que nem sabem o que fazem. Esse o mistério do viver: muito prazer! Encantada!
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