AS PESSOAS FALAM DEMAIS >> Clara Braga

A pessoa fala: "nunca vou esquecer aquela surra que levei, hoje sei que foi bem dada, nunca mais repeti aquilo que não era para fazer". Mas não fala que passou a vida inteira com problemas de autoestima e, em tudo que faz, procura a aprovação da mãe.

A pessoa fala: "uma palmada de vez em quando não faz mal à ninguém". Mas não sabe dizer porque vive se envolvendo em relacionamentos tóxicos e achando que ser mal tratada de vez em quando também é uma forma de ser amada.

A pessoa fala: "dê uma palmada agora, se não ele é quem vai bater em você quando crescer". Mas é incapaz de dirigir 15 minutos sem xingar e não vê problema em resolver as coisas de forma agressiva na rua.

A pessoa fala: "você viu aquela notícia horrível sobre aquele cara que maltratou o cachorro? Eu fui uma das pessoas que denunciou!" Mas quando vê pais abraçando crianças que estão fazendo birra na rua, fala mal, pois acredita não haver problema em pais violentos.

A pessoa fala: "eu apanhei e não morri". Era para morrer? Pois se era, o objetivo foi alcançado, essa semana uma menina de 5 anos morreu após levar um soco do pai por fazer xixi no chão. 

Quem apanhou e não morreu é sobrevivente e não educado. Não relativizem a violência com as crianças, violência e educação nunca foram a mesma coisa.


Comentários

Nadia Coldebella disse…
Dialogar é mais difícil. Exige empenho, insistência, atenção. Bater é mais rápido. Ensina a ficar calado e a resignar-se. Até a revolta explodir e a dor emocional virar a medida do "tá tudo certo", "tudo bem", "tô quebrado e nem sei".
Sensacional essa voz que vc está trazendo!
Gde abraço, querida!
Carla Dias disse…
Clara, seus textos sobre pais e filhos são realmente necessários. Falar sobre o que de fato é precisa ser natural.
Albir disse…
Essa cultura da violência parece não ter fim. É triste ver pessoas gentis e "incapazes de matar uma mosca" que, embora sofrendo, agridem fisicamente seus filhos acreditando tratar-se de um dever para com a educação deles. Sozinhos esses pais não são capazes de sair disso, daí a importância dos técnicos, psicólogos, pedagogos e professores na desconstrução dessa covardia estrutural.
André Ferrer disse…
A didática da família judaico-cristã recorre à violência porque se criou sob a tenda do olho por olho dente por dente (herança da Mesopotâmia que os escritores do Pentatêuco abraçaram) e se desenvolveu ao redor das fogueiras purificadoras de Roma.

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