NÃO LEIA. VOCÊ NÃO VAI SE INTERESSAR POR MIM >> Carla Dias >>
Eu era feliz e sabia, e andava à toa pela cidade, só para exercitar os pensamentos. E eles me calavam, que nunca foram de ceder a vez. Tentavam me embriagar do que eu não sabia e quase sempre conseguiam. Era ainda mais fácil em dias de garoa, quando eu caminhava à toa e atenta à líquida poesia.
Banhava-me com tentativas de ser feliz.
Só que ser feliz não é para qualquer um. É para cada um que compreende que a felicidade é uma visita, que chega ao fim de tardes de inverno, ensolaradas e lindas, de um jeito que só cabe à vida inventar.
Eu era inquieta e sabia que sabedoria não nasce quando não a queremos nascida. Experimentava o silêncio como se morasse em uma plataforma de partidas, em uma estação de trem, em lugar nenhum. Esperava as chegadas desconhecidas para reconhecer a mim no feito. Chegavam animadas com os beijos, os abraços e as boas novas. E presentes, planos e sorrisos.
Eu era e quem não seria? Feliz e sabia... Triste e sabia...
Sabia que nem sempre a felicidade seria proprietária da minha biografia. Que a tristeza seria a guardiã das minhas memórias, mas apenas de vez em quando. E que nesse equilíbrio - que muitas vezes parece inexistente -, eu guardaria escolhas, desfechos e lembranças.
Eu sou feliz, de felicidade que vive a me oferecer gentilezas. E os meus pensamentos, donos de mim, abrandam ao toque de cada delicadeza. Em dias de garoa, minha alma sorri, e o silêncio é boa companhia. E quando me despeço dele, é com a canção preferida do dia.
Eu sou feliz sempre que posso.
A inquietação me acontece. Aprendo a cada visita dela que questionamentos tendem a ser ótimas ferramentas para reinvenção. Reinvento-me em uma constância carnavalesca, de dentro pra fora, e sempre assim. Muito de mim continua o mesmo, mas não porque eu não soube mudar, e sim por eu ter compreendido que algumas coisas são o que são, e moram na gente assim, imutavelmente. Há quem diga que eu mudei drasticamente, que nunca viu em mim uma porção disso e daquilo. Há em mim a compreensão de que as pessoas nos enxergam somente quando estão prontas para aceitar todos os adjetivos que nos traduzem. E alguns deles são indigestos.
Eu sou inquieta para aprender meu próprio universo.
Imagem: sxc.hu
carladias.com
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