VOZ >> Cristiana Moura
Passei um tempo muda de palavras escritas. Andava sem ar. Um
dia depois do outro, um dia depois do outro, um dia depois do outro.
Obrigações, afazeres, afetos intensos e turbulentos, implosões, muito amor. Tanta gente,
tantas palavras a serem lidas, necessidades muitas a serem supridas. Faltou eu
para mim. Nem percebi.
Agora, ouço uma música desenhada de vento e silêncio a reger a leitura das crônicas que escrevi antes dos meses de mutismo. Nas órbitas
engendradas entre os escritos e as memórias estou reaprendendo a mim mesma.
Estou a petiscar trechos:
‘Tenho que me desapegar de mim, me abandonar.’
‘A gente vai fazendo nascer o que já existe.’
‘Os trovões explodem como os sentimentos
secretos que por vezes implodem em mim.’
'A arte tem dessas coisas — adentra a vida da gente e oferece outros itinerários ao cotidiano.'
'A arte tem dessas coisas — adentra a vida da gente e oferece outros itinerários ao cotidiano.'
Que coisa mais linda esta: uma vez desaprendida
de mim, poder revisitar-me. É como bater
palmas defronte à casa da vizinha e ser convidada para um pedaço de bolo, um
café, um fuxico.
Recuperei a voz.
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Não nos abandone.