Eu escolhi o que a vida me dava, mas não aprendi a escolher aquilo que eu queria>>>Nádia Coldebella.


Há algum tempo, me lembrei de uma música do Capital Inicial: “Se não faz sentido, discorde comigo, não é nada demais. São águas passadas, escolha uma estrada e não olhe, não olhe pra trás”. Sou um tipo de pessoa que nasceu em crise, questionando o sentido da vida, e muitas vezes me dei conta de que ela não tem sentido nenhum. Sou eu quem quer um. Então essa música chegou como um grande insight. Escolha uma estrada, minha filha, e não olhe pra trás.

Porém, uma constatação muito empírica da existência é que escolher exige lidar com a responsabilidade de não ter escolhido outra coisa. Uma espécie de Porta da Esperança (alguém lembra?), em que a pessoa se ressente de uma escolha quando a outra é melhor. Não sei se se aplica a você, mas se aplica a mim: nunca fui de me arrepender das escolhas que fiz, mas, atualmente, ando me lamentando por causa daquelas que deixei passar.

Seria a idade? Dei uma googlada por aí, perguntei para algumas IAs, mas, no fim, foi a minha própria experiência que deu a resposta. Sim, é a idade e a experiência (ou decepções) que ando acumulando, que me fazem questionar as escolhas impulsivas dos meus vinte anos.

Mais do que isso, esfregaram na minha cara o óbvio ululante: eu sempre fui do tipo “deixa a vida me levar, vida leva eu” e isso criou um grande problema nestes dias em que eu vivo. Eu não aprendi a fazer escolhas, mas eu finjo bem. Eu escolhia o que a vida me dava, mas não aprendi a escolher aquilo que eu queria. Desisti de querer muito cedo. As minhas escolhas foram motivadas por meus medos internos — parece clichê, mas é a verdade absoluta e vou escrever sobre isso outro dia.

Agora mesmo, estou escolhendo, sentadinha na janela da minha existência, observando a chuva cair. A minha escolha de agora implica em sair de casa e tomar o aguaceiro na cara, mas não quero me molhar.

O grande paradoxo é que a idade anda me trazendo a certeza de que eu poderia ter refletido um pouco mais, poderia ter tido menos medo, menos ansiedade. Poderia ter parafraseado os Titãs e sonhado mais, me arriscado mais e ter visto o sol nascer. Só que a vida está passando, e eu continuo com medo de me arriscar.

É isso.

Se tem uma coisa que chega com a idade é o poder de organizar metáforas e permanecer na confusão.

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Escute aqui: 
Não olhe pra traz, do Capital Inicial
Deixa a vida me levar, do Zeca Pagodinho
Epitáfio, dos Titãs

A imagem do texto foi criada por I.A.


Comentários

Jander Minesso disse…
Meu pai sempre dizia: “cada escolha é uma renúncia.” E acho que de algum jeito essa frase também me deixou com medo de tomar decisões. Há quem diga que é geracional.
Zoraya Cesar disse…
"Se tem uma coisa que chega com a idade é o poder de organizar metáforas e permanecer na confusão". O que nao chega são as respostas. Nunca há respostas. Ao falar com uma amiga sobre um arrependimento na minha vida, de algo q deixei de fazer, deixei passar e agora nao dá mais, ela me disse: e vc sabe lá se essa escolha teria trazido o conforto que vc afirma q teria? A vida é cheia de variáveis.
Entao, só posso te dizer o q tento fazer - e mtas vezes consigo, outras nao - põe um casaco e um guarda-chuva na bolsa, tapa o nariz e vai. Pq ficar é sempre pior.
Cristiana Moura disse…
“Se tem uma coisa que chega com a idade é o poder de organizar metáforas e permanecer na confusão.”

Indentificada… que desfecho perfeito para um texto tão potente!
sergio geia disse…
Concordo com a Cristiana. Potência é o que se tem aí.
Albir disse…
Conte mais, Condessa. Vou me identificando e aprendendo a ir mais fundo com suas reflexões.
Pelo jeito, não é só com a pá que você gosta de cavoucar.
Não há como fazer omelete sem quebrar os ovos.

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