SILÊNCIOS DE INVERNO >> Sergio Geia
Uma cena.
Estou na padaria aguardando o café.
Ele chega de mansinho, aproxima-se do balcão, espera. Não pede nada nem lhe perguntam sobre o que deseja.
Eu o conheço da praça, já o vi mexendo em lixeiras em busca de latinhas.
Sempre que cruzo com ele em minhas caminhadas digo bom-dia. No começo não respondia, parecia estranhar tal reverência.
Então aparece uma moça da padaria e lhe serve um copo de café.
Ele bebe devagar, em pé, com prazer.
Vejo que outra moça deixa num canto sobre a mesa alguns produtos como pães, torradas, biscoitos, acondicionados em sacos plásticos transparentes. Ao terminar o café, ele retira do bolso da calça uma sacola plástica de supermercado e guarda com cuidado os produtos ali deixados.
Tudo ocorre em silêncio, desde a sua chegada, o café, os pães. Parece cena ensaiada, os personagens sabem o que fazer, está tudo marcado, já devem tê-la reproduzido à exaustão, não precisam da fala, há um certo automatismo.
Embora entenda o que esteja acontecendo, sinto o ambiente frio, quase beliscando o hostil.
Então ele sai.
Não olha dos lados, nem pra trás, nem pra ninguém.
Viro a cabeça para observar: timidamente ele agradece à mocinha do caixa com um leve meneio de cabeça e depois desaparece na claridade da manhã.
Ilustração: Pixabay
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