A MORTE >> whisner fraga

 


uma imobilidade vai se adensando, o frio avança pelas trincheiras,

a notícia persegue, não importa o quanto me esquive:

meu amigo morreu, 

ligam três vezes, não atendo,

assim, nada pode acontecer, sem meu conhecimento, sem o solene comunicado, não há morte e o amigo ainda sorri, caminha, narra seu habitual encanto com alguma descoberta,

alguém digita uma mensagem, o fato me cerca, não leio, desligo o celular, desligo tudo,

preciso de alguns minutos,

preciso que a normalidade ataque outro homem menos comprometido com a dor,

mas não é sobre mim, 

então me reconecto ao mundo e descubro que meu amigo morreu.


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imagem: pixabay, sem atribuição requerida.

Comentários

Nadia Coldebella disse…
A negação básica e primária de um fato incontestável e imutável. Caminha juntinho com a frustração e impotência. "Meus pêsames" são palavras vazias; "eu sinto muito" são melhores.
Seu texto é doloroso e necessário.
Sinto muito mesmo.
Albir disse…
Como diz Manoel Bandeira: a iniludível.
Como ensina Nádia: eu sinto muito!
Zoraya Cesar disse…
'preciso que a normalidade ataque outro homem menos comprometido com a dor'

Meu Deus, como todos os que perderam alguém amado sentem isso, precisam disso, e nao conseguem exprimir. E vc o fez linda e tristemente.

O que dizer? Sinto muito, Whisner.
Anônimo disse…
"Amarelas e medrosas" como escreveu Drummond. André Ferrer aqui.
Como é duro perder um ser querido… suas palavras refletem com justeza e beleza esta dor. A ideia de fugir para não receber o anúncio me lembrou o maravilhoso livro do David Grossman, A Mulher Foge, já leu?

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