PROCURO ALGUÉM PARA POR A CULPA >>> Nádia Coldebella

Desde que eu nasci, muitas coisas aconteceram. Foram anunciados pelo menos quatro fins do mundo desde o início da minha reles existência. Ainda bem que foram adiados. Eu não poderia comparecer, já tinha compromisso.

Só que hoje em dia, as coisas são bem diferentes. Ninguém espera ninguém. Ninguém mais anuncia nada com clareza. É tudo muito sutil.

Os anjos do apocalipse parecem ter esquecido que a gentinha que habita esse planeta é bastante limitada. E que precisa de avisos com um certo drama. Quase uma palestra show. Quase uma apresentação com ares de grande evento. Um Rock in Rio da Ecatombe.

Tá, tem muita coisa acontecendo, mas isso não vale.


Por exemplo, um asteroide caiu esses dias, apenas duas horas depois de ser percebido. Ele era de um tamanho razoável para ser percebido antes, mas pequeno para fazer grandes estragos. Tudo bem, o mundo ainda de pé, só que ele não foi per-ce-bi-do, dá pra entender? Então me desculpem queridos anunciadores do fim do mundo, mas nem da para chamar isso de aviso!

Outro dia teve uma gripezinha com ares de pandemia, que ainda está felizinha por aí. Todo mundo cansou de ficar em casa, do alquinho em gel, de cumprimentar batendo cotovelo, de fazer live. Mas não tem problema, o povo gosta mesmo é da “vida loca”. Deixa a desgraça pra lá. Alguém topa uma baladinha? Vamos aglomerar? Nada de vacina, ela não ajuda: esse é o espírito para contribuir com o progresso do vírus e o desprogresso da humanidade. E o virus bem que precisa de uma mutaçãozinha assassina nova. Que tipo de aviso é esse então, meus caros mensageiros dos horrores finais?

Ah, bem no começo de 2022 teve o vulcão em Tonga, que de tongo não tinha nada. Dizem que a erupção foi mais poderosa que uma bomba atômica. Mas nada estranho nisso… Essas coisas são normais.

O povo achou estranho mesmo é o mundo estar novamente sentado num barril de pólvora. Se bem que a  guerra está rolando lá do outro lado e a gente aqui, desfrutando da normalidade. 

Se preocupar pra que? Tem muita gente junta pedindo intervenção militar, rezando pra que a oposição seja morta. Tudo com muito sentido, mantendo a lógica da Terra plana e da recente bolha de  idade média. Logo logo eles se resolvem...

O problema, arautos do derradeiro fim,  é que essa enrolação gera um certo estresse, entendem?

Veja o meu caso. Eu já pensei que o mundo havia surtado. Também já pensei que a gente se adaptava igual a uma lagosta. Houve um tempo em que eu considerei a aleatoriedade das coisas. Cheguei a pensar que o mundo tinha mesmo acabado em algum momento e que a gente achava que estava vivo, mas estava mesmo era num tipo de purgatório. Outro dia considerei concordar com a abdução. Alienígena, no caso.

Só que agora, não interessa mais. Tô  p da vida. Estou mesmo é procurando alguém pra por a culpa.

Acho que nessa história toda, feliz é aquele catador de lixo que há algum tempo atrás, ficou milionário depois de encontrar âmbar cinza. 

Até então, ambar cinza seria vômito de baleia solidificado.  Mas, depois de um tempo, alguns cientistas disseram que não era vômito, era o produto do intestino da baleia, ou seja, cocô. 

No final de tudo, para o novo milionário, esse cocô todo fez algum sentido. 

No meu caso, eu aguardo o resultado da mega sena. Ou do fim do mundo. O que vier primeiro em 2023.

Comentários

Zoraya Cesar disse…
hahahaah, o lado mal humorado da Countess Velvet, hoje do lado avesso. Mas como não concordar, né? Acho mesmo q a humanidade gosta de um drama, só pode.

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