bobo >> whisner fraga

 


cortou a fila, chacoalhava uma lata de refrigerante, calmo,

se eu podia pagar: é só três e cinquenta, moço,

a atendente já havia fechado minha conta e partia para a cobrança, 

eu pedi que acrescentasse o refrigerante do sujeito,

ela respirou o mais fundo que pôde, me encarou de cima a baixo antes de responder um quase inaudível sim,

o homem agradeceu, ganhou a rua, sumiu,

ele vem aqui todos os dias, sempre tem alguém que compra pra ele,

que bom, respondi, feliz: ainda tem gente boa nesse mundo, né?,

ela não deixou barato: boa nada, boba,

é malandro, vive disso, de esmola,

sobrevive, corrigi, 

não me sentia enganado: concordei com a situação toda, 

ele me pediu educadamente, me inteirou do valor como quem insinua que o dinheiro não me fará falta, jogo sem constrangimentos,

o dia nublado, a garoa querendo crescer para chuva, é bom ser idiota em um mundo tão inteligente,

um golpe de três reais e cinquenta, quem faria isso?,

como sobreviver com golpes de três e cinquenta?


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foto sem autoria, retirada de um mecanismo de busca.

Comentários

Jander Minesso disse…
Sou campeão de dizer “não” e ficar me remoendo de culpa depois. Agora entendi o porquê.
Anônimo disse…
Eu sempre pago. É uma forma de fazer a grana circular. Dinheiro tem que circular. André Ferrer aqui.
Zoraya Cesar disse…
uma pequena gentileza que salva duas almas. mesmo de quem nao acredita nela. engraçado como quem é 'pobre', também, como a moça do caixa, é tão intolerante com quem está em situação pior.
Albir disse…
Malandro que arranca três e cinquenta, enquanto a Selic vai a 15% de justa remuneração para o capital.
Nadia Coldebella disse…
A gente deve dizer não? Porque
não? Porque sim? Se é golpe e eu sei q é golpe e escolho o golpe, é golpe? O bobo sabe? Ou só é bobo se não sabe?

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