UMA DAS NOITES DE NINFÉIA >> Ana Raja
Se aparecesse uma hora depois da habitual, me encontraria recolhida.
Tira da bolsa um maço de cigarro. O fogo demora a pegar na ponta branca do papel. Senta ao meu lado e puxa a fumaça, com tal força, que, mesmo na condição de espectadora, me faltar o ar. Quando lança para fora o que restou, uma leve tontura me balança. Fuma um, dois, três, então deita de bruços no mármore respingado de água parida pelo sereno. Quando se levanta, bicos dos seios salientes por baixo da seda fina. Calcinha marcada na única parte que me parece suave.
Talvez sinta saudade.
Raiva.
Talvez sinta solidão.
Antes de ir embora, se aproxima de mim. Abaixa a cabeça, e me cheira com a mesma força de quando puxa a fumaça pesteada. Perco pétalas com o seu toque desagradável. Minha cor - sempre tão viva - começa a esmorecer.
Ela se levanta, pega a bolsa caída no chão, faz o sinal da cruz errado. Avisa que amanhã me levará para a puta que destruiu a sua vida. Me fecho no cair da noite e rezo para morrer de vez.
------
As dores delas, primeiro livro de Ana Raja, está a venda no www.editoraurutau.com.
Comentários