GENTILEZA É UMA FORMA DE ABRAÇO << SORAYA JORDÃO
Acordei atrasada, indisposta, irritada. Acabo de lembrar que não paguei o IPVA. O
remédio que deveria ingerir antes do café, esqueci de comprar. O achocolatado próprio
para diabéticos, que eu pretendia beber antes de sair, alguém pegou o último. No
banheiro, minha irmã enfrenta uma gastroenterite.
Não acho meu celular. Cadê a chave? Pronto! Entro no carro, ligo o rádio. A primeira
notícia avisa que o trânsito está infernal por conta do fim das férias escolares. Já sei que
a saída da minha garagem, sempre desgastante, será um desafio. Ninguém mais dá a
vez nesse mundo de urgências. A editora me pergunta pela crônica que eu deveria ter
postado hoje cedo. Confundi as datas, não fiz. Abro o portão da garagem, tudo parado.
Vontade de desistir. Voltar para cama e esperar a TPM da vida passar. Hoje ela está
para confusão.
Ouço uma buzina. O motorista sorri e me dá passagem.
Queria parar o trânsito, descer do carro e abraçá-lo. Gritar para o mundo que ainda
existem pessoas boas, que não se deixam vencer pela pressa dos dias vazios.
Como não fiz isso, escrevo essa crônica como testemunho do poder regenerativo da
gentileza.
Ninguém abraça ou faz laço sozinho.
Segui o dia esbarrando com pendências, entraves, desafios, mas persistiu em mim um
sorriso de paz.
Obrigada, moço, por escolher ser generoso.
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