SOL >> Ana Raja
A avezinha começou a assimilar a coreografia do voo e se apresenta bem. Ouviu os conselhos e os alertas dos mais velhos sobre os perigos de estar no ar, por isso, não arrisca movimentações não compatíveis com a sua idade. Durante o voo, sente o sopro frio do vento, se encantando com a proximidade do céu. Quando exercita as suas asas, os pensamentos avançam em direção a outros limites. Seu pensar não tem regras, e isso lhe dá a impressão de ser dona do seu bico, apesar de saber que isso acontecerá somente daqui a um tempo; entende que se rebelar não a levará a lugar algum. A teimosia, o bico duro e os questionamentos podem trazer consequências trágicas.
No entanto, o que a incomoda, mesmo com sua pouca idade, é seu nome de batismo, não quer mantê-lo. O motivo não é a beleza, pois ele encanta a todos. A questão é não estar confortável com a roupagem oferecida por ele. Carregar esse registro aninhado no peito, tornou-se um peso refletido nos voos. Acanha-se quando perguntam qual é o seu nome, e o piado sai tão baixo, dificilmente se entende a sua resposta. As aves mais velhas, responsáveis pela sua educação, não entendem o motivo e veem como desrespeito a recusa do nome escolhido para ela, ainda no ninho, enquanto era alimentada e amada. E por mais que a avezinha tente explicar, não lhe escutam.
Durante um passeio proibido e arriscado, alçou voo em direção ao sol. Em um primeiro momento, sentiu medo. Um calor desconhecido, e a certeza de que havia quebrado as regras, assustaram a avezinha, fazendo com que voasse, de pronto, para uma área mais segura.
À noite, não conseguiu dormir pensando no que havia acontecido à tarde. Suas asas ainda sentiam o calor do voo, compartilhado com seus irmãos naquele ninho apertado, acolhedor de três aves em crescimento. Os outros a acharam febril. Não abriu o bico para contar da sua ousadia.
Sua aventura secreta representava algo mais. No dia seguinte, ao amanhecer, recusou o alimento trazido por sua mãe. A avezinha ficou em pé na borda do ninho, as asas repousadas. Então, voou para mais perto do céu e decidiu que, a partir daquele voo, se chamaria Sol.
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