PARAÍSO NAS AMÉRICAS - final >> Albir José Inácio da Silva
(Continuação de 25 de novembro de 2024)
O nosso patriota retornou à
antiga militância, coração cheio de júbilo e esperança no Make Brazil great too
- como ele dizia nas ruas. Foi ao regressar de uma dessas performances que
encontrou a mulher transtornada. A polícia esteve lá para prendê-lo porque
rompeu o lacre da maldita tornozeleira.
Não! Cadeia nunca mais! Ainda
mais agora que a nossa bancada conservadora acabou com a saidinha por causa dos
bandidos. Uma coisa aprendeu com o mito: “Posso estar morto, preso nunca! A
liberdade vale mais que a vida!”, lembrava ele, enquanto juntava alguns
pertences numa mochila.
A esperança era o Mito Argentino.
Vários patriotas se refugiaram no país vizinho com a vitória do conservador da
direita cristã e estão em segurança. Com seus cabelos revoltos e sua
espiritualidade animal, Milei chegava ao poder no exato momento em que as
perseguições e prisões políticas ameaçavam os brasileiros de bem. Nosso herói precisava
de tempo até que o grande irmão do norte viesse em socorro dos patriotas.
Mas tudo pode piorar, “neste mundo
tereis aflições”. Quando se preparava para atravessar a fronteira, ouviu a
notícia. A polícia argentina estava prendendo os refugiados e devolvendo para as
garras do STF. Essa notícia foi para ele mais dolorosa que a cadeia. Uma traição!
Os patriotas chegaram a este
fundo de poço por uma série de traições. A primeira foi dos generais-melancia,
que se acovardaram no momento da ação. Já tinham em mãos até o ato
institucional que daria suporte jurídico ao movimento democrático, mas
refugaram. Com suas roupas verdes, incentivaram, convidaram, garantiram, mas
com seu coração vermelho, decepcionaram e traíram a nação.
Depois foi a vez do ajudante de
ordens, a pessoa em quem o Mito mais confiava. Bastou um aperto do inimigo e
ele cantou o que pediram e o que não pediram. Assim não há movimento de
libertação que resista!
Até a tecnologia, que deu o zap responsável
pela cultura política dos patriotas, parece ter traído a causa do bem. O
equipamento comprado de Israel para investigar os comunistas foi usado agora para
prender os comandantes. E dezenas estão na fila, indiciados como bandidos, quando
deveriam ser homenageados como heróis, tão somente por terem tentado a
implantação do reino de Deus na Terra.
A luta é “contra os principados,
contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste mundo, contra as
hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais” (Efésios, 6:12). Após a
vitória dos comunistas vermelhos da esquerda bolivariana, os chefes da intervenção
planejaram “neutralizar”, com veneno, balas e explosivos, aqueles que seguiam
ameaçando e prendendo os patriotas. Alguma coisa precisava ser feita ou, em
breve, as igrejas seriam fechadas, cartilhas gay e mamadeiras eróticas seriam
distribuídas nas escolas e creches.
Delatados, os comandantes foram
parar nas prisões em que já estavam centenas de combatentes. Parece até que o
Senhor virou as costas para o seu povo. Traídos pelos irmãos e abandonados por
Deus!
Ultimamente andam falando que o Mito
também traiu o povo, fugiu para Miami deixando aqui os seus guerreiros para
serem massacrados. Mas o nosso herói não acredita. Para ele o capitão saiu para
comandar do exterior a resistência patriota.
Sentiu-se perdido. A polícia no
seu calcanhar, sem passaporte e dinheiro para chegar à nova Gilead do Trump, e agora
Milei deportava os patriotas. Mas seu sacrifício não seria em vão! Que as próximas
gerações usufruam das mudanças! Ao nosso patriota restava cumprir até o fim a
sua missão.
- Vou fazer o que precisa ser
feito – respondeu ele quando a mulher, assustada, perguntou aonde ia com
aquelas coisas.
- Então vou com você.
- Não. Pra certas coisas, mulher
atrapalha.
- Mas a polícia vai te procurar
aqui, vão me interrogar, vou acabar me queimando!
- Neste caso, queime também as
provas.
Chegou à Praça dos Três Poderes sem
ser incomodado. Estacionou perto do Congresso. E aproximou-se do alvo.
Os seguranças perceberam seus
movimentos e mandaram que parasse. Acionou pelo celular a bomba do carro que
estava no estacionamento do Congresso para desviar a atenção.
Mas foi cercado. Não conseguiria
se aproximar do templo do mal. Se não podia atingir os algozes, destruiria pelo
menos o símbolo, a estátua da deusa Têmis. Mas errou o alvo. Tentou novo arremesso,
sem sucesso.
Os soldados se aproximaram e,
antes que o alvejassem, ele acionou outra bomba, abraçou-se a ela e gritou:
- Por Deus, pela pátria e pelo
Mito!
Nos delírios da agonia enxergou, nos
portões do paraíso, um grande anjo branco de braços abertos, cabelos dourados,
abdômen protuso e camisa da CBF.
Descansou em paz.
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