S.O.S. ACADEMIA >> Albir José Inácio da Silva
Hoje me movimento já com algum desembaraço pelos aparelhos da
academia, mas não posso esquecer minhas desventuras de principiante no fitness.
A timidez não chega a me paralisar. Se tenho que fazer, faço,
depois contabilizo os resultados. Mas confesso que aquela garotada irreverente,
fazendo coisas difíceis com facilidade, assustava um pouco as minhas acumuladas
primaveras.
Por isso escolhi um mês de férias no trabalho, para que
tivesse o tempo necessário à adaptação e, como tinham me orientado, pudesse
frequentar no meio da tarde — horário em que a academia ficava quase vazia.
O professor rabiscou uma série e explicou rapidamente os
aparelhos, tudo muito fácil segundo ele. Sobre os pesos, ou carga — esse é o
nome correto — disse que era pessoal e o aluno adaptava à medida que evoluía no
treinamento. E seguiu para outras muitas atividades.
Tarde sonolenta, academia vazia, professor ocupado, um garoto
solitário na esteira, uma magrinha e eu. Eu, meio perdido, com uma ficha na
mão, articulações enferrujadas e alguma preguiça. Tudo em paz, beirando a
harmonia.
Se há alguma coisa de que não posso reclamar é do
acolhimento. Sempre aparece alguém com empatia e boa vontade para me ajudar nos
começos difíceis. Foi assim com a magrinha. Eu não saberia dizer sua idade,
talvez por causa das roupas coloridas, dos gestos harmoniosos e da magreza.
Sei que era só gentileza e paciência com este neófito,
abandonado pelo professor e pela coragem. E me explicou aparelhos, alavancas e
velocidades. Sempre que me via olhando a ficha, lia comigo e interpretava.
Fiquei observando seus movimentos no LEG 45: esticava e
flexionava as pernas, travava e liberava o peso ao final ou início de cada
série. Até que se levantou e foi ao bebedouro.
Acho que, embora muito grato pela ajuda até ali dispensada,
quis impressioná-la, mostrar minha desenvoltura e independência. Olhei para o
aparelho e achei que havia muitas e grandes anilhas, mas não me preocupei.
Se minha amiga, magrinha daquele jeito, conseguia levantar
com facilidade, ritmo e um sorriso tranquilo, por que eu não conseguiria?
Sentei-me no aparelho, apoiei as costas e coloquei os pés na placa de
sustentação, como a tinha visto fazer. Empurrei os pés e liberei o peso.
Meus joelhos bateram no peito, eu não conseguia respirar nem
me mexer. Também não conseguia gritar.
A magrinha levantou a cabeça do bebedouro e viu meus braços
agitados em desespero. Chamou por ajuda, e eu lembro das pessoas retirando as
anilhas e me segurando pelos braços. Minhas costas não se endireitavam mais.
Minhas pernas estavam bambas. Sei que falavam comigo, mas eu não ouvia.
Aos poucos, as vozes foram voltando. Quiseram que eu me
sentasse, mas eu tinha medo de não levantar mais. Consultaram-se sobre a
necessidade de ligar pra SAMU, e eu protestei. A academia parou, todos a minha
volta, e eu querendo sumir. Só tinha certeza de uma coisa: nunca mais voltaria
ali.
Mas voltei, anonimamente, outro horário, outro professor,
outras magrinhas. Tinha aprendido um pouco mais sobre prudência e humildade. E
sobre aparências e enganos.
Obs: Este texto faz parte do Programa Crônica de Um
ontem e foi publicado originalmente em 27/07/2015.
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