NADA AMADA AMANTE >> Ana Raja
A exposição da imagem da mulher, o discurso sobre o motivo (se é que ele existe) do ato covarde, me remete à consequência de um passo maldado por ela. Eu quase ouço a frase: “tá vendo, só! Quem mandou se envolver com homem casado”, isso chega a me dar um desassossego no peito.
No dicionário, um dos significados de “amante” é “pessoa que mantém relacionamento amoroso extraconjugal”. Muitos se atêm à apenas essa definição, mas, para mim, se trata de um rótulo infeliz quando definidor do caráter de uma mulher. É falta de respeito com o corpo morto, mutilado, aniquilado. É passar por cima de uma história e reduzir essa pessoa a nada.
É preciso haver um cuidado a mais ao contar a história dessa mulher, uma busca detalhada para conhecer a sua rotina. Conversar com os amigos, com a família, com a vizinhança; visitar seu local de trabalho, dar voz a essas pessoas, ouvir os lamentos de quem perdeu o convívio com alguém amado.
Os pesquisadores responsáveis pelas informações dessas matérias poderiam resgatar as fotos da infância, dos brinquedos, da formatura, das viagens com as amigas, dos brindes e das conquistas. Deveriam mostrar essa mulher por inteiro, seria mais justo do que ver um recorte mal-acabado de sua vida, resultado de uma rasa compreensão de uma palavra.
Ao anunciar os nomes, por que não fazê-lo com mais empatia? Joana, Laura, Luciana, Matilde, Sandra…. e assim, nos permitir enxergar as dores delas, provocadas pelo fato de serem mulheres. A mim, interessa também conhecer seus sonhos e sua trajetória até o encontro com o seu algoz.
Há meios covardes de se enganar uma mulher. Isso existe desde sempre. Homens com mais de uma família, mães solos com filhos de pais comprometidos. Homens apaixonados com promessas cativas do quarto. Homens se sentindo no direito de ter quantas mulheres quiserem. Homens autodenominados os donos delas. Homens que ainda decidem pela morte de muitas de nós, e nos executam sem piedade.
Não julgo os relacionamentos dos outros, pois não os vivo. Deveríamos nos ater aos sentimentos humanos, a vida como ela é, cheia de imperfeições, e não procurarmos rótulos, esse ferrete de marcar gados; de calar uma história que não se resume ao seu fim.
Imagem © Sabrina Belle, por Pixabay
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