CONSTRUÇÃO >> Carla Dias >>
Na
construção cabe tijolo, alambrado e tinta capaz de curar parede com marca
de tempo. Não precisa ser novo de tudo; o bem cuidado, não raro, enfeita com
novidade o que muitos acham já ter se curvado ao fim. Fim tem mania de se
insinuar por longo período, levando-nos a acreditar ter chegado para ficar. E então
nos enroscamos nos cabelos dele, sentindo a maciez cruel do que jamais será. De
repente, ele decide sambar em outra vizinhança, e ficamos a sós com nós mesmos,
despidos das nossas proteções, confusos sobre qual caminho seguir. Nem sempre
isso importa, e botamos o pé na estrada das ousadias, porque quem beijou a boca
do fim, sabe que ele brinca de quase acontecer, mas nunca deixa de concluir seu
trabalho. Isso a alegria não faz. Ela aprecia despetalar lindezas para se
mostrar aos crentes na sua eternidade, mesmo somente no durante de um apanhado de minutos; no quando a sua duração se estica por horas, feito um
milagre pelo qual temos apego. Depois, a mágoa se aproveita para desfilar pelos
poros da efemeridade da alegria, e isso inicia ditos e feitos. Tem choro de desaguar
em antessala, ou às escondidas, no canto da varanda ou debaixo da chuva de confetes
de carnaval fora de época. Há mar de se esconder dos olhos ao boicotar o marejar.
Às vezes, fica difícil se desfazer da seca. Alinham-se os astros, e nem sempre para provocar
as marés. Alinham-se astros, pensamentos, planos, aspirações. Se houver sorte,
da boa, a reciprocidade pode dar as caras e ser lida em cartas de tarô; aparecer,
coerente e receptiva, de braços dados com o diálogo. Na construção, a solidão é
abismo do qual somos içados pelo amor. Amor é palavra de tez macia e duração indefinida,
e para defender seu significado, não nos poupa das aflições de dilatar
sensibilidade, elas que chegam mancomunadas com adágios de nos embriagar até não sabermos quem somos a sós.
A sós é
construção.
Acompanhado,
idem.
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