A DOR DO OUTRO >> Ana Raja
O marcador do tempo: o tamanho do corpo.
É possível imaginar a fragilidade, como sempre.
O perigo sondava, sentia o cheiro da inocência,
resvalava nos sonhos.
Uma bala, um míssil, um tapa, um empurrão, uma palavra.
Então, estourou aquele futuro insanamente.
Destroços.
É possível identificar a vulnerabilidade,
assim como tocar o que desmanchou.
Não se sabe ao certo quantos anos.
O corpo está coberto por um lençol parecido com papel alumínio.
A bestialidade de todas as guerras.
A mãe também não foi poupada.
E por que seria?
Se arrastaria pelos becos escuros em culpa…
melhor assim.
Ele ficará ali…
até o corpo ser recolhido.
Ele ficará ali...
sentado na cadeira que lhe ofereceram.
A cor dos cabelos de anos, o ombro curvado, o olhar assombrado.
Ele trocaria de lugar.
Deus sabe, trocaria.
É isso, a imposição pela força com o único objetivo de proteger interesses próprios.
Desde que o mundo é mundo.
Ele continua à espera — até que a levem para além da calçada manchada de sangue.
Quanta dor….
Deus sabe o quanto.
Uma menina de 8, 9 ,7 anos?
O avô sabe dizer.
Desacomodado em uma cadeira, anestesiado, surdo pela explosão, aguarda o resgate do corpo.
A menina é pequena para ficar sozinha.
Comentários
Como sempre sua escrita é impactante. A estrutura com frases curtas é tocante e nos leva a refletir sobre muitos aspectos dolorosos do cotidiano.
a ultima linha, em especial, é de uma crueza e dor sem tamanho.
fico imaginando o desespero do avô.
senscional!