A SINCERIDADE DAS CRIANÇAS >> Clara Braga
Aqui em Brasília tem uma via, uma das principais da cidade, que corta o plano piloto de uma ponta a outra. É a via que forma a tal "asa do avião" e é popularmente chamada de Eixão.
Pois bem, essa via fica fechada para carros aos domingo e aberta para que as pessoas possam caminhar, correr, andar de bicicleta, etc.
Já tem anos que funciona assim, desde 1991 para ser mais exata. Mas, com certeza, a pandemia mudou a forma como o brasiliense aproveita essa opção de lazer.
Por ser uma via bem larga, são seis pistas ao todo, o Eixão foi bem visado naquela época em que só podíamos frequentar locais abertos e arejados. Então, um local antes muito frequentado apenas por quem praticava esportes, passou a ser usado para várias atividades.
Hoje, um domingo no Eixão é um verdadeiro evento, tem jazz, choro, rock, food truck, brinquedos infláveis, feiras de artesanato e o que mais a criatividade te permitir imaginar.
Eu sempre gostei de ir ao Eixão correr e, depois que me tornei mãe, gosto de levar meu filho para andar de bicicleta. Mas conforme foi ficando mais cheio, também foram aparecendo tendas de vendas com pessoas que têm coragem de interromper seu exercício para tentar te vender as mais variadas coisas, desde imóveis até uma nova bebida de açaí que vai fazer você ficar fitness em um piscar de olhos.
Nada contra, sei que as pessoas que inconvenientemente param a gente no meio do nosso exercício estão apenas cumprindo ordens e tentando atingir metas de vendas. Mas acho muito chato ter que ficar explicando que eu não estou interessada em comprar um imóvel no momento, que eu estou apenas tentando me manter saudável e esquecer que atualmente eu mal tenho dinheiro sobrando para um sorvete, que dirá para comprar um imóvel.
Foi então que, no último domingo, eu fazia minha corrida enquanto meu filho me acompanhava em sua bicicleta. Uma mulher em uma dessas tendas viu que íamos passar e foi se posicionando na nossa frente. Quando estávamos chegando perto dela, ela já foi falando: vocês têm pets em casa?
Eu, me achando muito esperta, fiz cara de quem infelizmente não iria poder ajudar e disse que não. Então ela foi para o lado e me deixou passar. Mas eu esqueci que uma das coisas que eu mais falo para meu filho é que ele não deve mentir.
Foi então que ele não titubeou e foi logo falando: mãe, a gente tem sim! Você não sabe o que são pets? Pets são animais, nós temos duas cachorras, vai lá falar com a moça.
Eu, sem maturidade alguma para assumir que tinha mentido, apenas fiz cara de surpresa e fingi que realmente não sabia o que eram pets. Comecei a correr mais rápido e rezar para a moça não ter ouvido ele falando que a gente tinha sim, até porque se eu voltasse lá eu já tinha uma explicação na ponta da língua, ia falar que meu filho considera os ursinhos de pelúcia seus pets.
Sim, eu não só não tive maturidade para assumir que tinha feito uma coisa errada como inventei outra mentira para sustentar a primeira. E assim a gente segue nessa empreitada louca que é a maternidade, rezando para que nossos filhos demorem bastante até descobrirem a quantidade de cagada que a gente faz enquanto tenta ensiná-los a não fazerem cagadas.
Comentários
Ser mãe é mentir no paraíso, também, com o objetivo de manter a paz e evitar a chatice. Depois vem a culpa.
(Mas olha, se vc arranjar explicações mirabolantes para sustentar as mentiras essenciais, dá pra estender isso em alguns anos, kkkk! Daí, quando vc for exposta, faça cara de paisagem).
Gde bjo!!!