TORRE DE PINDORAMA - final >> ALBIR
(Continuação de 11/03/2019)
Tudo indicava que, embora a eleição não tivesse acontecido
ainda, o poder havia trocado de mãos.
Houve, sim, alguma resistência.
Ou talvez nem se possa chamar de resistência aos protestos murmurados pelos
corredores por uma minoria assustada. Vanesse saíra da Assembléia muito
nervosa, tentando disfarçar as lágrimas e o tremor. Estava envergonhada de sua
covardia, apoiou os golpistas por medo, mas agora se sentia muito mal.
Foi pelas escadas pra não
encontrar ninguém, mas ao passar pelo segundo andar, viu Selma e Mirna – duas
mulheres que, segundo o Reverendo Felício, viviam em pecado contra a natureza e
ainda usavam “tóchico”, conforme ele escrevera no livro de ocorrências da
portaria.
Também elas estavam assustadas
com a repressão que se anunciava. E lembraram de Pai Luiz, do sétimo, que lhes
tinha cochichado ainda durante a Assembléia: “Vou ter que ir embora daqui. Eles
não vão me deixar em paz. Principalmente o Leiroz - eu sei mais do que devia.”
Para não chamar a tenção, apenas
Selma foi falar com o pai-de-santo. Combinaram uma reunião no terraço, à tarde
do dia seguinte. Ninguém ia ao terraço nesse horário por causa do calor. Cada
um pensou em mais algum insatisfeito ou ameaçado pelos novos donos do poder e
convidou para a reunião.
Apesar da discrição dos
envolvidos, o movimento inabitual em direção ao terraço não passou despercebido
ao já agora fiel porteiro cooptado pela nova política. Passava o dia atento ao
monitor das câmeras espalhadas pelo prédio. Mas a reunião começou.
- Chamamos vocês aqui porque acho
que estamos todos no mesmo barco – começou Vanesse. - Antes de querer a
administração do prédio, esses três já infernizavam a vida de muita gente. Não
conhecemos em detalhes as histórias uns dos outros, mas já sabemos que este
lugar se tornou um risco para nós.
Seguiram-se relatos de ameaças e
violências, mas a de Pai Luiz chocou a todos.
- Há quase um ano, Leirós e
Jaimito chegaram na minha porta com um carrinho e várias caixas, pedindo que
guardasse por algum tempo porque tinham recebido muita mercadoria e não tinham
como armazenar. Protestei, mas Leirós levantou a camisa mostrando uma arma e
disse que esse favor não seria esquecido, que eu seria recompensado. Pensei em
ir à polícia, mas eles tinham mencionado minha mãe e minha irmã. Sabiam o
endereço delas. Naquela tarde mesmo a polícia chegou no prédio e revistou o
apartamento deles. Claro, não acharam nada. Ainda tem caixa até hoje na minha
casa.
A porta foi aberta com violência,
e o trio ternura entrou aos berros.
- Vocês estão brincando conosco?
Que palhaçada é esta? Já não basta a imoralidade de suas vidinhas medíocres?
Até armas foram puxadas entre as
ameaças e os xingamentos.
- Acabou a paciência com vocês,
bando de desocupados! Seu eu fosse vocês, procurava outro lugar pras suas
bruxarias e indecências!
Não se falou mais no assunto nas
próximas semanas. Rumores circularam de que os “terroristas” - como foram
classificados os revoltosos - estavam já procurando lugar para morar.
E chegou a Assembleia, sem que
ninguém mais se candidatasse. O triunvirato comemorava já a vitória, aguardando
apenas a formalização pela administradora de condomínios que presidia e
secretariava a reunião.
O porteiro entrou assustado:
- Seu Jaimito... – engasgou.
Mas a polícia entrou na sala em
direção aos eleitos.
Leirós que estava perto da porta
lateral ainda tentou sair, mas ali também havia policiais. E, com eles, Pai
Luiz e os demais desclassificados.
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