COLECIONADOS >> Carla Dias
Quem encosta o olhar na realidade dela não tira muito dessa espiadela, não. Os olhares tropeçam na sua figura para se esborracharem um pouco mais adiante, em qualquer objeto ou sujeito que preenche a vista com o escandalosamente diferente, o silenciosamente significativo, o indiscretamente cáustico, o obscenamente medíocre. A questão está no dilacerante, na taquicardia do imediato, não se deita no corpo do tempo para alimentar observação, como a dita gosta de fazer: perder-se no pode ser.
Existe aninhada entre os dentes da janela — da alma, como a poesia gosta de tentar enganar realistas; e dos conflitos, sala de estar dos sofredores burocratas. No entanto, a criatura sabe navegar por labirintos como poucos indivíduos são capazes de fazer. É quase um desfilar de tropeços coreografados para evitar tombos. E quando é impossível não se entregar a eles, encontrar o chão é feito pausa na gritaria da necessidade.
Entre os colecionados, segredos para negociar soltura de impropérios nos dias de se misturar às outras criaturas. Compreende ser fundamental controlar a impaciência ao lidar com a pressa delas, porque é mais fácil viver a urgência, não a morosidade antecessora de algumas descobertas que valem ser incluídas na prateleira das lembranças.
Anda necessitada de relembrar, contanto que a memória evocada seja de fazer a pele despertar em arrepios. Precisa reconhecer, vez em quando, a existência de corpo no qual habita seu espírito, porque tem horror à possibilidade de se descobrir criatura imaginada, um desabafo da imaginação de outro ser.
Imagem © Mystic Art Design, por Pixabay
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