QUARESMEIRA OU O QUÊ? >> Sergio Geia
Minha última crônica deu o que falar e rendeu no assunto paisagismo. Ou, para ser mais exato, árvores. Se você não a leu, ela está aqui
É que eu disse num certo momento que descansava à sombra de uma quaresmeira. Não era quaresmeira. Embora não seja botânico, tenho plena consciência de que quaresmeira não era. Apenas usei a palavra pela palavra, por gostar dela, por achá-la de uma beleza plena e simples. Mas, detalhe: avisei ao leitor sobre isso; enganar, jamais.
Ocorre que alguns amigos me enviaram mensagens. José Manoel, por exemplo, amigo da região de Campinas, disse que tem em seu quintal uma quaresmeira e duas oitis. Se eu estivesse caminhando por lá, certamente teria parado à sombra das oitis, pequenas, bem-moldadas, mas com sombra agradável. A quaresmeira de lá não faz sombra, mas Manoel disse que eu poderia chamar as oitis de quaresmeiras, e eu certamente as chamaria.
Carla Dias, exímia escritora, que na semana passada lançou em Sampa, no MandaCafé, o seu livro “Fugas – pausas e desatinos”, pela Editora Laranja Original — que não li, mas que deve ser ótimo porque conheço o trabalho da Carla —, disse que a palavra quaresmeira também a agrada profundamente.
Alguns amigos partiram para a troça. Edna Kamezawa, por exemplo, apostou se tratar de um ipê-amarelo. Disse a ela que não. Ipê-amarelo definitivamente não. A minha ignorância paisagística não me impede de reconhecer um. Aqui na minha rua, por exemplo, há vários ipês-roxos.
Rúbia Fagali apontou para um manacá. João Bosco disse que se continuasse assim, iriam dizer que minha quaresmeira não passava de um pé de couve, comentário ao qual Edna concordou com risinhos, acrescentando que um cronista inspirado pode até transformar um pé de couve numa quaresmeira; ainda mais estimulado por dosinhas de uísque, não perdeu tempo João Bosco.
Rubem Braga tem uma crônica que trata da mesma temática, chama-se “ Um pé de milho”. Diferente do Geia, Rubem era um entendido. Disse que em seu quintal descobriu um pé de milho. Transplantou-o para um exíguo canteiro na frente de sua casa. Quando estava do tamanho de um palmo, um amigo passou e disse que era capim. Com dois palmos, outro amigo disse que era cana. Com dois metros, porém, o que surgiu foi um esplêndido pé de milho, lançando suas folhas para além-muro. Rubem conclui a crônica feliz de dar gosto, dizendo que seu pé de milho pendoou:
“Há muitas flores belas no mundo, e a flor de milho não será a mais linda. Mas aquele pendão firme, vertical, beijado pelo vento do mar, veio enriquecer nosso canteirinho vulgar com uma força e uma alegria que fazem bem.” (Um pé de milho, Editora Record, 7ª edição, pg.50).
Infelizmente, sem a expertise do Braga, não poderei dizer o mesmo da minha quaresmeira, que de quaresmeira não tem nada. Depois da minha crônica, um amigo sabichão, ciente da localização da árvore, disse-me que é um flamboyant. Se for, vou adorar, porque tal qual a quaresmeira, o nome também muito me agrada.
Ilustração: Pixabay
Comentários
Mas eu gosto muito da ideia de que não importa muito, vc encontrou na árvore a essência da quaresmeira, não importando as opiniões! O q importa mesmo é sombra nesses dias tão fustigantes.
Abço, querido!
André Ferrer aqui.