O NOVO CONCÍLIO DE TRENTO >> André Ferrer

Francis Bacon: Estudo sobre o retrato do
Papa Inocêncio X de Velásquez (1953)
Qualquer administrador precisa do maior número de informações acerca daquilo que administra. Entradas e saídas, ganhos e perdas, que impactam no processo, deveriam alimentar todas as tomadas de decisão. A empresa ideal teria que possuir um sistema impecável de sensores capaz de fornecer dados relevantes em tempo real. Qualquer Estado, também, economizaria tempo e evitaria problemas caso aproveitasse uma diversidade de dados na hora de decidir.

Estamos na Era da Informação, o que vem sendo propalado e é sabido há décadas. Um tema sempre acompanhado de um tom alvissareiro. Porém, o século do Admirável Mundo Novo não é só maravilhas. Ele jamais chegará ao fim sem que as relações humanas sejam questionadas e modificadas. O homem do Século XXII terá, certamente, uma outra forma de ver coisas como liberdade de expressão e privacidade. A revolução tecnológica terá, obrigatoriamente, os seus desdobramentos na vida privada e social.

Empresas e governos conhecem a população mais do que nunca. Com o aperfeiçoamento da inteligência artificial, essa lente alcançará, nas próximas décadas, o indivíduo nos seus mínimos e inconfessáveis detalhes. O debate mundial acerca da ética envolvida, já bastante crescido hoje em dia, tende a ficar mais acirrado nos próximos anos. Prós e contras em relação a sistemas de controle, por exemplo, engrossarão a Guerra Cultural e, decerto, elevarão os ânimos a níveis, no mínimo, desgastantes. O mundo chegará, portanto, a dilemas como este: os mesmos dados que podem diminuir a fome e, por exemplo, diminuir os impactos da exploração de recursos naturais, por outro lado podem escravizar o homem de uma forma sem precedentes.

Tenho curiosidade em relação ao futuro. Como esses dilemas serão resolvidos? Quem sabe, o caminho para um uso isento da informação não está na própria inteligência artificial? Na criação de uma entidade capaz de conhecer cada indivíduo, assim como as suas relações, sem recair nas famosas segundas intenções de que o ser humano é tão capaz?!

Seria maravilhoso. Falta muito, entretanto, para que o ser humano aprenda o suficiente para inventar o verdadeiro ferramental da isenção. O que temos no horizonte, por enquanto, são equipamentos que poderão, sim, ajudar a resolver problemas com economia de tempo e maior eficácia mas que, também, deixarão a população vulnerável a uma engenharia social sem precedentes. Um Big Data capaz de alimentar a maior e mais eficiente empresa de controle humano já concebida desde o Concílio de Trento. 

Realmente, o Século XXI entrará para a História como uma verdadeira sinuca de bico.

Comentários

Nadia Coldebella disse…
Um texto denso e cheio de perspectivas ( ou profecias?) Para uma época densa e cheia de incertezas. Mas as crises e a ruptura das tradições é que precedem as grandes mudanças, não é mesmo? Então o q será que nós espera?
Ótimo texto!
Albir disse…
O que se pode esperar é mudança de patamar na racionalidade, depois da modernidade. Como aconteceu com Trento em relação a Niceia. Mas novos mecanismos de controle serão instaurados no "concílio" do século XXII.

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