CITIUS, ALTIUS, FORTIUS II >> Analu Faria

"Eu precisava de ficar pregado nas coisas vegetalmente e achar o que não procurava." (Manoel de Barros)

Estudar na Escola Estadual Messias Pedreiro era um saco. Eu vinha de uma escola particular, onde, apesar de não sermos tratados como minideuses como se vê em muitas instituições privadas por aí, tínhamos certa liberdade e voz. No Messias, a gente só tinha direito de obedecer. Não podia usar boné (não que eu usasse, mas eu achava a regra estúpida), não podia ser vista pelos corredores (sempre tinha uma supervisora chata para te perguntar o que você estava fazendo fora de sala de aula), tinha que ir para a educação física fora do horário da aula (eu acabei arranjando uma justificativa para não fazer). Tinha também que apresentar uma espécie de carteirinha que comprovava presença. Na escola particular, não tinha isso.

Estudar na Escola Estadual Messias Pedreiro foi uma bênção.

No último feriado, viajei para a cidade onde morei quase toda a vida — Uberlândia —, onde fica “O Messias”, como todo mundo chama a escola. Fui com o coração pesado, por uma série de problemas que  tive um pouco antes. Ao embarcar em Brasília, pedi a Deus por um milagre. Um que mudasse minha vida, e que acontecesse naqueles dias de folga, porque a coisa era pra já.

Desde que esses problemas me incomodavam, eu não rezava, porque foi justamente no último dia em que havia rezado, agradecendo a Deus por x e y, que a vida colocou no meu colo umas bombas que atingiam justamente o x e o y. Resolvi que só rezaria se fosse extremamente necessário. E era. Eu estava mais perdida que cego em tiroteio.

No fim do último dia de viagem, ainda nada de extraordinário. Por volta das 18h, chegaram Adriana, Telma e Flávia. Adriana com a família toda, incluindo a Melissa, a filha mais nova, uma menina de cinco anos, que me trollou no mais alto nível. Eu nunca disse, mas a inteligência da Melissa me lembra muito a da mãe. Telma veio sozinha, mas pelo menos veio! Da última vez que fui a Uberlândia, não tive a oportunidade de vê-la. Fez falta não conversar com alguém que parece sempre ter uma resposta — ou pergunta! — sábia para quase tudo. Flávia veio com o marido e as histórias que sempre me fazem rir — geralmente incluem o amor contraditório dela, uma mulher delicada, por coisas como caratê ou caminhões-betoneira.

Dessa vez a Adriana comandou a comida. Fez um churrasco de primeira, dizem os comedores de carne. Meu queijo e meu pão de alho estavam ótimos. Na maior parte do tempo, os homens ficaram conversando com meu pai, que adora a visita deles. Na maior parte do tempo, nós mulheres ficamos juntas, conversando sobre como a vida era há 20 anos, o que mudou, o que melhorou, o que ficou, o que piorou, quem se casou, fulano se tornou advogado, o outro se recuperou de um derrame, meu Deus, minha memória tá péssima, você lembra da fulana? E a Luciana, que não vemos mais? Ela não mudou de cidade? Você lembra da nossa primeira sala no Messias? Ficava atrás da cantina, era pequena, era horrível, eu lembro: o 1º G!

Às 22h todas haviam ido embora. Afinal, todas têm filhos e no dia seguinte era Dia das Crianças. Fui dormir por volta das 23h, com o coração leve e a cabeça mais fresca. Carregava comigo a bagagem que pensava não ter. Tinha um sentimento longe de ser mais que um nó de desejos inúteis. Nenhum milagre aconteceu. Nada mudou minha vida, naquele feriado.

Nada precisava mudar.




“O Lema Olímpico Citius, Altius, Fortius, que em latim significa "mais rápido, mais alto, mais forte", foi proposto pelo Barão Pierre de Coubertin quando da criação do Comitê Olímpico Internacional em 1894.” (Fonte: Wikipedia)

Comentários

Zoraya disse…
Analu, vc está se saindo uma memorialista de primeira, delicada e interessantésima! Espero que seu milagre venha. na hora certa, da maneira certa. Beijos
Analu Faria disse…
Obrigada, Zoraya!!!
De repente esse milagre já aconteceu ;)
Simples e belo milagre, Analu. :)

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