SOBRE VESTIBULAR, FUTURO E OUTRAS COISINHAS >> SORAYA JORDÃO
Quando começa o agito do vestibular, tem início a temporada de sofrimento de pais e filhos. Da parte dos adolescentes, fica claro em suas narrativas a angústia inerente à tomada de decisão, a insegurança que faz jus à incerteza do amanhã e o medo atroz do arrependimento. Além disso e acima de tudo, em muitos casos, senão na maioria, se sobressai a tortura emocional oriunda do desejo de uma profissão que não é valorizada pela família e pelos amigos. Não que os vestibulandos de Medicina, Direito e Engenharia não sofram também, mas é um outro tipo de desconforto. Nesses casos, o fator estressor é a pressão para estudar a todo tempo e a pesada expectativa de aprovação na primeira tentativa. Porém, diferente dos outros vestibulandos, eles contam com o apoio e a excitação familiar pela certeza de um futuro economicamente promissor.
Da parte dos pais (já estive nesse lugar) surge o desespero, fruto da ameaça de um futuro instável e sem proteção material e do proclamado fracasso atribuído às profissões que escapam das três áreas coroadas de louros ao longo dos tempos.
Curioso que ninguém perceba o quanto somos movidos por interesses e desejos e que isso é condição fundamental de envolvimento, aprendizagem e sucesso emocional. Sem isso, o percurso é tortuoso e pode não levar onde se espera.
Estranho que tenhamos tanta dificuldade para aceitar que o futuro dos filhos não está sob o nosso controle e que a garantia que podemos oferecer não se dá pela curatela da escolha e sua recompensa material, mas na parceria e participação ao longo do caminho.
Precisamos pensar sobre essa dubiedade: quero que meu filho tenha autonomia, mas só depois que ele assumir as posições que eu determinar para ele.
Ainda que as intenções sejam as melhores, isso não significa que fazem o bem. O melhor que acreditamos conhecer para nossos filhos pode simplesmente não ser, pode apenas representar o melhor dos nossos anseios ou desejos frustrados.
Quantos meninos e meninas, nesse exato momento, estão exilados no quarto, aterrorizados com o peso da vida adulta?
Vivemos num tempo em que não se pode arriscar, tentar, errar, recomeçar. Tudo é definitivo, absoluto e esmagador. Tanto o futuro quanto o medo de encará-lo.
O que estamos produzindo e reproduzindo? Quantas emergências lotadas de médicos frustrados, ansiosos, desinteressados e deprimidos? Quantos advogados e engenheiros soterrados em angústia, insônia e ansiedade?
Espero, nesse tempo de vestibular, que os jovens tenham coragem de ser o que são e que os pais sejam fortes o suficiente para manterem-se junto na caminhada, sustentando a aposta na força do desejo e na potência de felicidade que mora na liberdade de ser, fazer e acontecer.
Comentários
Muito boa a sua reflexão, minha amiga!