MÁRIO >> Sergio Geia

 


Taubaté. Praça Santa Teresinha. Domingo.
 
À minha frente um rapaz, em pé, encostado na porta do carro. Num primeiro momento, tive a impressão de que o motorista pedia explicações sobre alguma rua. Pouco tempo depois a conversa entre os dois estava encerrada. 
 
Quando me aproximei, ouvi uma voz conhecida: 
 
— Fala, Serjão, só na caminhada? 
 
Era o Mário dentro do carro. 
 
— E daí, Mário, nossa, quanto tempo? 
 
Ele me disse que sua esposa estava na missa, que não era muito chegado, que a esperava para a feira. 
 
Mário é contemporâneo do meu pai. Ele e seu irmão tiveram um bar na Santa Teresinha, muito frequentado pelo velho e pelo meu tio, a dupla inseparável. Num outro momento eu o via numa padaria perto de casa, ele ajudava no caixa. Por fim, sumiu, até aquela manhã na praça. 
 
Continuei a caminhada já tomado por uma dúvida: o Mário não seria Celso? E Celso foi martelando na minha cabeça até pelo menos o meio da praça, quando me convenci: era Celso. Que mancada, falei sozinho, chamei o Celso de Mário. Vou me desculpar. 
 
Tão logo virei a esquina, estiquei o olhar confirmando se o carro ainda estava lá; estava. Ao me aproximar, outra dúvida: seria o Celso, Celso mesmo? 
 
Não é possível, pensei. E nos segundos seguintes, aflito, obedeci ao meu impulso e não parei, já torcendo para que meu amigo se chamasse Mário Celso. 
 
Algum tempo depois, no mercadinho em frente de casa, meu tio cravou: é Celso. Se tem Mário na frente, eu não sei. Paciência, eu respondi. Comprei o pão, paguei, e fui embora desgostoso da vida, pensando que Mário Celso é nome tão comum, tão comum... 
 
 
Ilustração: Pixabay

Comentários

Nadia Coldebella disse…
Pelo menos você lembra o nome e as referências, mesmo que trocados. No meu caso, dou abraço, converso com a pessoa como se a conhecesse à séculos, pergunto sobre a família, o trabalho, dou conselho e digo tchau. Saio com a outra pessoa feliz e eu sem ter a mínima ideia de com quem estava falando. No teu caso, acho que ele era Mario Celso mesmo. Certeza!
Jander Minesso disse…
Quem nunca deu uma dessas, né? Cara, como eu gosto do jeito que você recorta o cotidiano e coloca essa mágica nas coisas mais simples. Que delícia de texto!
Sylvia Testa Braga disse…
Querido Sergio Geia . Eu gosto tanto das suas tiradas .
Engraçado que isso acontece com todos nós.
É Celso ou é Mário ou melhor será Mario Celso?
Acontece muito comigo . E as vezes não falo o nome e aquilo fica martelando na minha Cabeça!
É isso aí querido.
O importante é que a crônica sai.
Parabéns querido. Boa noite !
Zoraya Cesar disse…
Vc agora nos representou, a nós, os injustiçados, os marginalizados pelos que têm memória fisionômica. Ninguém lembra que nós, os desmemoriados e desconectados tb temos um coração e precisamos contar nossos micos sem q nos olhem com desprezo.
Isso sem falar na maestria da escrita, né? E na leveza. E no tudo!
Albir disse…
Sofro disso há bastante tempo. Então evito nomes. Dou abraços, mando lembranças pra família, falo "há quanto tempo" e sorrio.
sergio geia disse…
Grato, queridas e queridos.

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