PEDAÇOS DE MAIO > > Sandra Modesto
Sozinha andava pela Rua Nua de gentes.
Observo mais adiante e a nudez se vestiu em Formatos humanos. Alguns buscavam sonhos. Talvez.
Meu tênis gasto já transformava meu caminhar. Hipérbole em meus pensamentos.
O moço comia o que sobrou da cesta básica, um senhor em busca dos restos dos dias. Eu percebi alguém ao meu lado. Tentei disfarçar. Uma linha fina separava o que eu senti. Mais uma dose da solidez.
Minha calcinha enfiada sob minha calça jeans. Minha camiseta transparente. Árvores secas rasgando o tempo. Sol triste.
Alguém me segue. Acelero.
— Não é nada, não, tia. Fui só buscar o pão e trombei com a senhora. Na minha casa, o pão é Sagrado.
Que burguesinha estúpida. Eu me prestei a desempenhar o papel de uma personagem que eu nunca fui.
Corri pra espantar meu próprio eu.
Uma mulher varre a rua.
Uma dor sem Nome.
Você precisa terminar uma história. Mas você está incompleta. O domingo anda tenso por aqui.
Se as águas de março fecham o verão... E maio? Nem águas têm.
Na última semana, a chuva apareceu. Cheia de estranhezas.
Dia seis eu fui vacinada contra o Maldito vírus. Dá certo alívio. Um fundinho de futuro.
Eu li muitos livros nesse maio Pandêmico. Clássicos e contemporâneos. Vi muitos filmes.
Ah, esqueci, minha mãe gostava de cama arrumada. Loucura, mãe.
Pego meu pijama. São dez horas da noite, escovo os dentes e me espalho.
E, é assim, quando a gente escreve com o corpo, a gente cata os pedaços.
Que moram dentro da gente...
Comentários