O MUNDO É DOS CALANGOS >> Clara Braga

Se os calangos soubessem que nós temos mais medo deles do que eles de nós, já teriam dominado o mundo.

Claro, quando digo “nós” estou falando de mim e dos outros integrantes do seleto grupo que eu costumo chamar de: clube dos cagões que não sabem explicar de onde tiram seus medos.

Eu tenho mesmo uns medos inexplicáveis. Além de calangos, detesto baratas embora elas nunca tenham feito nada contra a minha pessoa. Cigarras nem se fala, se entra uma pela janela eu praticamente saio por onde ela entrou. Aranha das pernas finas e pequenas eu até encaro, e quando eu digo encaro estou sendo literal, fico encarando-a para não perder de vista até chegar alguém para tirar ela de lá.

Poderia fazer uma lista mais extensa, mas esse não é o objetivo dessa crônica. O tema que eu queria abordar, para a surpresa de zero pessoas, é maternidade. Quando nossos filhos nascem é inevitável criarmos certas expectativas sobre a forma como vamos criá-los. E um dos meus objetivos quanto à educação do meu filho era justamente evitar passar para ele esses meus medos infundados, mas temo estar falhando drasticamente.

Certo dia, decidimos colocar na varanda do nosso apartamento um bebedor de beija flor. Rapidamente eles começaram a vir diariamente beber a aguinha deles. Vem pequeno, vem grande e até outros tipos de pássaros já vieram. A gente fica admirando e tentando passar para o nosso filho essa admiração e carinho que a gente tem que ter pelos animais.

Ele já conhece o barulho do beija flor, quando escuta lá do quarto, vai correndo para a varanda para poder observar o pássaro. Um belo dia, convidei meu filho para observar o beija flor mais de perto. Expliquei que tínhamos que ir bem devagar em sua direção, para não assustá-lo, e assim fizemos.

Quando estávamos na varanda, acho que o beija flor decidiu que também queria observar a gente mais de perto e entrou em casa. Juro que o que aconteceu dali em diante é inexplicável, mas em minha defesa, agi por puro reflexo. Não vou dar detalhes, ainda prezo pela minha dignidade, mas é o suficiente dizer que em questão de segundos até a cachorra estava se tremendo escondida embaixo da pia do banheiro.

Eu e a cachorra nos recuperamos do susto, mas meu filho até hoje, quando escuta o barulho do beija flor, corre do quarto para a varanda gritando como se estivesse indo de encontro ao seu inimigo no início de uma batalha. Não sei como os pássaros continuam vindo para a nossa varanda, só sei que consegui a proeza de fazer meu filho achar que beija flor pode causar algum mal, mas o leão não, já que eu agi normalmente quando vimos um no zoológico.

Comentários

Zoraya Cesar disse…
kkkkk, q mancada hein, Clara? Agora vem um longo trabalho de recuperação para seu filho desencanar do passarinho e a promessa de contar em detalhes a perda da sua dignidade frente ao beija-flor
Albir disse…
Muito difícil educar. Se eu tivesse trezentos filhos, no tricentésimo ainda não saberia lidar com ele.
Paulo Barguil disse…
Ah, Clara, que situação! Acredito que você conseguirá transformar este medo filial e nos contará a saga.

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