PERDAS E MUDANÇAS >> Mariana Scherma
Uma
vez, em uma aula bem frustrante de física, no primeiro dia do curso
pré-vestibular, com vários alunos que queriam estar em qualquer lugar menos
naquela sala, meu professor disse: “as coisas mudam quando vocês menos esperam,
não desanimem”. Pra muita gente ali, soou como blábláblá motivacional, eu
fiquei com aquela frase na cabeça ressoando até o fim da aula. Motivo: tinha
esperança de ser chamada pela faculdade, já que era a primeira da fila de
espera. Para todo mundo, minha situação no cursinho já tinha data pra acabar,
mas eu sempre fui do time de São Tomé e só acreditava vendo.
Não
se passaram nem dois dias, minha mãe surgiu com o maior sorriso do mundo na
janela do cursinho. A faculdade tinha me ligado na sexta-feira e eu precisava
me apresentar na próxima segunda. Desde esse dia, tive certeza de que as coisas
mudam mesmo – e é quando a gente menos espera. Talvez hoje eu esteja escrevendo
sobre mudanças porque estou morrendo de saudade daquele sorriso enorme da mami.
Faz dias, semanas que o sorrisão sumiu. Meu tio adoeceu e se foi. Quero que as
coisas mudem logo para os meus primos, minhas tias, minha mãe e minha avozinha.
Quero que essa tristeza se dissipe no vento, quero que eles fiquem apenas com
aquelas lembranças gostosas do meu tio que, aos poucos, tornam a dor da perda
menos insuportável.
Sempre
achei que a gente era meio egoísta ao querer que alguém tão doente, tão sofrido,
continuasse entre nós. Mas talvez não seja egoísmo, seja medo de perder as
lembranças, de precisar olhar uma foto para lembrar os contornos do rosto de
quem partiu, se esquecer da voz de alguém que tanto amamos, do jeito de olhar,
das manias... Esquecer deve ser a maior dor do mundo. Alguém que escapa entre
seus dedos, como se fosse água, como se fosse etéreo.
Vai
ver, no fundo tudo é meio etéreo. A gente, a dor, a alegria, o choro, a risada,
as lembranças. Talvez, as lágrimas, que são etéreas também, quando se secam indicam
que a dor está indo com o vento. Quando o choro seca, as coisas ao nosso redor
começam a mudar, no ritmo da dor, mas começam. Aí vem o primeiro sorriso, ainda
triste, ainda sem coragem de mostrar os dentes, mas vem. Na sequência, a gente
vê todo mundo que está em volta, lembra que o amor não deixou de existir e
percebe as pequenas mudanças. Só o fato de o sol sempre aparecer todo dia sem
se importar com a dor ao redor mostra que o amor não acaba. E eu quero muito
que a minha família sinta esse sol sob a pele, sob a alma talvez. Gente que a
gente ama não deveria sofrer.
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