VADE RETRO I >> Albir José Inácio da Silva
Era uma reunião comum na sala
grande da fazenda, família numerosa, fazendeiro bravo, filhas virgens
protegidas por winchesters e um único filho, obviamente destinado a desfrutar
das filhas dos vizinhos que desavisadamente diminuíssem a vigilância.
Seu Rufino repetia, no seu jeito
calmo, batendo os dedos na mesa pra marcar as pausas:
- Nesta família, o que não for
mulher, é macho. Ou então defunto!
Podia ser uma reunião tranqüila, mas
o tema desafinava: Genildo, o filho adolescente, sabe-se lá por quê, não vinha
cumprindo com o que dele era esperado pelo pai, pela família e até pelas filhas
dos desavisados.
O menino cresceu em meio às
assombrações e aos sustos que lhe podiam inculcar. Mas no momento certo foi desacreditando
de Papai Noel e demais bobagens da infância. Só ficou um: o medo da danação
eterna por causa dos pecados da carne. Não conseguia se livrar dos maus pensamentos
nem das mãos pecaminosas. Sofria com as admoestações do Padre Antônio e se
aferrava ao bom comportamento e às coisas religiosas.
Culpa do padre, pensava o
fazendeiro. Sufocou o menino com essa coisa toda de pecado, de não pode isso e
não pode aquilo, que ele perdeu as forças diante de tanta proibição. A igreja só sabe
amedrontar, mas não tem solução pra essa força irresistível que pode
conduzir às profundezas do inferno. Como sempre, a santa madre igreja arrocha o
fiel com ameaças de castigo e fogo eterno, mas ele não pode aguentar e segue
pecando, e se multiplicando, e se culpando. Mesmo que não vá para o inferno,
vive na terra o inferno de carregar culpas e medos de perdição por causa do que
não pode evitar. E sempre vai ficar a dúvida: o padre, como é que resiste, se é
que resiste, a essa tentação que não vem de fora, está dentro do corpo, como
uma bomba pronta para destruir a pobre criatura?
Seu Rufino lidava bem com cavalo
xucro, touro assassino, peão abusado e até onça, mas desses assuntos se
esquivava, principalmente quando envolvia seu único filho macho. Por isso chamou
o padre que, além do dever paroquial, tinha obrigação de ajudar a resolver o
problema, já que ajudou a criar. E também porque sabia pedir dinheiro sem a
menor cerimônia.
Mas o padre estava de má vontade,
não concordava com o rumo que a reunião ia tomando. Pra começar, convocaram um
tal de Tio Genésio, com fama de libertino e conhecedor de antros pecaminosos
dali até Belo Horizonte, e poderia ajudar a destravar o menino e afastar eventual
risco de ele amaricar. E, pra piorar, o reverendo estava sendo responsabilizado
pela muita santidade que o menino apresentava.
E Tio Génésio disse logo a que
veio:
- Este menino precisa é de rapariga!
Fica agarrado em saias de tias e padres, - nada
contra o senhor, viu, seu padre! - enquanto
os outros moleques estão lá, no bem-bom, desfrutando a safadagem.
(Continua em 15 dias)
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