BARULHINHOS >> Fernanda Pinho
Outro dia, tentando elaborar para duas amigas o porquê de eu
não conseguir parar de tomar refrigerante, saí com essa: “Ouvir o barulho de
uma lata de Coca-Cola se abrindo é uma das coisas que mais me emociona na vida.
Possivelmente, deixará de ser meu barulho preferido apenas quando eu tiver um
filho e escutar seu choro pela primeira vez”.
Reconheço. Posso ser bastante exagerada quando quero defender meus
pontos de vista. Hipérboles à parte, é verdade. Alguma coisa acontece no
meu coração — estômago e papilas gustativas — quando abro a latinha.
E não somente isso. Vários outros barulhinhos banais me
emocionam. Ontem tive um dia exaustivo, estava cansada e angustiada. Fiquei
deitada no sofá e só voltei ao normal quando escutei o barulho de pipoca
estourando na cozinha. Meu marido realmente me conhece. Alegria imediata, mesmo
antes de comer a pipoca. Até agora não lembro o motivo de estar angustiada.
E para não dizer que todos os barulhos que me emocionam têm
a ver com comida, me recordo de outros. Desde sempre, me emocionei com o
barulho do carro da minha mãe entrando na garagem quando ela chegava do
trabalho. De criança até o último dia em que morei na casa dos meus pais, aos 28
anos. Depois que casei, transferi a
emoção para o marido. Meu coração palpita quando escuto a chave na porta.
Costumava palpitar também quando eu ouvia o aviso de
mensagem no celular. Isso na época em que celular só servia para ligações e trocas
de mensagens. Hoje em dia, são tantos aplicativos que o que me
emocionava para o bem passou a me emocionar para o mal. Solução: todas as
funções constantemente no silencioso.
Aliás, já pensou que maravilhoso seria se a gente pudesse
colocar no silencioso tudo aquilo que nos irrita? Porque, claro, de barulhinhos
maus o mundo também está cheio: buzina, fogos em dias de jogos, tique-taque de
relógio na madrugada, água corrente quando você está a fim de fazer xixi e, ai
ai ai, garfo arranhando o fundo do prato. Eita que me arrepio só de imaginar.
Essa vai entrar para minha lista de desejos improváveis: colocar o mundo no mudo e ouvir só o que nos faz bem.
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Beijo!