AMIGOS COM BLUETOOTH >> Mariana Scherma
Eu nunca sei quando me tornei amiga dos meus
amigos. Quando digo amiga, estou me referindo àquela relação de poder ligar a
qualquer hora, de pedir um conselho sabendo que você vai ouvir a verdade (goste
ou não do que vier) e, principalmente, de sacar o que ele está pensando só no
olhar. Aliás, acho esse último item o mais importante numa amizade. É a
intimidade que você não consegue forçar, precisa de um tempo de amizade pra
existir. Amigos com Bluetooth, sabe?
Fico encanada de não saber quando meus amigos
viraram tão essenciais na minha vida porque, oras, tenho bem poucos. Os
“amigos” são vários, mas os amigos sem aspas que decifram meus pensamentos só
pela covinha ou pelo olhar torto cabem na palma da mão, talvez uma mão especial
com mais do que cinco dedos. E eu faço a eles a mesma pergunta sempre: você se
lembra de quando a gente virou amigo pra valer? Nunca chegamos a nenhuma
conclusão. A gente se lembra de quando se conheceu, de quando achou que seria
amigo, mas não aquele momento “virei amiga de verdade do fulano”. Pensando
melhor, talvez porque essa sacada não exista. É como aquela frase (sei lá quem
é o autor, só sei que não sou eu) “a gente não faz amigos e, sim,
reconhece-os”.
Esse momento de virar amigo de alguém acaba sendo
abstrato. Pra mim, pode ser quando eu ouvi uma piada besta dele ou dela, que
não fez ninguém rir, só eu e meu novo-reconhecido amigo. Já para o meu amigo,
eu posso ter entrado pra sua lista seleta quando olhei nos olhos dele e prestei
atenção em cada palavra da sua história. O fato é que a gente se vê amigo e
pronto. O resto do tempo anterior à amizade vira uma sombra, no maior estilo
“por que a gente não se conheceu antes?”.
E o mais legal nesse nível de amizade é que você
vira íntima de uma pessoa com todos os “apesar de...” e não “por causa de...”.
Meus amigos são-paulinos, palmeirenses e santistas gostam de mim mesmo com o
meu lado corintiano fanático que, apesar de ser um baita defeito pra eles, é
deixado em segundo plano e vira motivo de piada. E só sendo meu amigo MESMO pra
eu relevar uma piada do Timão. Eu, hippie de alma, sou muita amiga de uma
galera que precisa pensar na roupa bem antes de sair de casa e que sabe usar
delineador e andar em cima do salto 10 com destreza. Amizade forte se constrói com
as diferenças. Você entende, aceita, faz piada e fica ainda mais próximo. Se
você perde o amigo depois da piada, não adianta: ele não era tão seu amigo
assim, vai por mim.
A ideia dessa crônica nasceu depois de algumas
cervejas num boteco com alguns dos meus amigos, na véspera das festas de fim de
ano, época em que a gente acaba se reunindo mais e comemorando bem mais. Ainda
bem que existem esses dias (beijo, Papai Noel!). Nunca entendo por que, na
correria do ano, a gente deixa de se reunir ou prefere falar dos problemas a
reviver as alegrias. Mas os amigos de verdade estão com você também na hora das
reclamações. Quanta sorte a minha (e a sua) de ter amigos que aguentam o tranco
da chatice diária! É por isso que prometo, em 2014, sentar mais vezes na mesa
do boteco e falar de coisa boa com meus amigos queridos. Taí uma promessa que vou
cumprir com gosto e dedicação.
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