X-TOUCINHO >> Mariana Scherma
Dia
desses estava fazendo hora numa livraria e resolvi abrir um livro com “300
palavras em português – para estrangeiros”, a ideia do livro era facilitar a
vida dos gringos ao falar “por favor”, “obrigado”, “quanto custa”, essas coisas
de turista. Acreditei nisso até chegar ao bacon. Sabe como o livro ensina o
pobre gringo a falar bacon? Toucinho. Isso aí, toucinho, sendo que bacon
funciona muito bem no Brasil. Eu nunca pedi um x-toucinho. Você já? Foi aí que
percebi que zombar o bem-intencionado turista era a função mais certa pra
definir o livro.
Na hora, me lembrei de uma amiga que foi fazer
intercâmbio em Sidney, na Austrália. Quando os amigos, cada um de uma parte do
mundo, peguntavam como se dizia “oi, tudo bem?” em português, minha amiga
explicava que era “e aí, o que que tá pegando?”. Obviamente, depois ela passava
mal de rir ao recordar eles tentando falar essa expressão que, nossa, a gente
usa todo dia... Só que jamais. Está um pouco no DNA do brasileiro fazer graça,
contar piada de argentino, português e cia. Não acho isso errado e confesso que
já contei muita piada (minhas amigas japonesas não me deixam mentir) e morri de
rir do o-que-que-tá-pegando da minha amiga. É uma questão cultural, o Brasil é
o país da piada fácil, do riso solto, do bom humor. Até aí, ok, tudo certo.
Mas
depois fiquei pensando... Logo menos, receberemos turistas aos montes. Copa das
Confederações, do Mundo, Olimpíadas, sem falar no tanto de turista que chega todo
dia e feliz da vida pra conhecer nosso país. Imagina se todos eles decidirem
pedir um x-toucinho pra matar a fome. Vai ser o maior bullying da história. O
que vai ter de brasileiro rolando de rir e o que vai ter de gringo com cara de
interrogação... Uma loucura! Primeiro porque ninguém pede x-toucinho, segundo
que para um estrangeiro dizer toucinho vai ser complicado. Nosso nh é um dos
maiores mistérios da humanidade, mas que vale a pena ser trabalhado – pra pedir
caipirinha, não toucinho.
Eu,
que até o dia em peguei o livros das 300 palavras em português, não sabia ao
certo o que viera fazer no mundo e suspeitava que o motivo da minha existência
andava meio preguiçoso duvidoso, descobri nesse dia. Vou espalhar a
todos os gringos que bacon continua sendo bacon por aqui. Toucinho é uma
palavra engraçadinha, mas que pode bem ser substituída. Se a gente quer explorar o
turismo brasileiro, tem que melhorar o relacionamento. Vamos guardar as piadas de
portugueses, argentinos e japoneses pra nós mesmos, é nosso tesouro interno. Mesmo
porque, pra eles nem tem graça. Vamos parar com o bullying contra o gringo, ele
já é castigado pelo nosso sol tropical, pelas camisetas floridas que teima em usar por aqui e pelo nh da caipirinha. Para eles,
vamos exibir a simpatia e o jeito amigo brasileiro. Eu, você, minha amiga do
que-que-tá-pegando e o livro das 300 palavras em português. Sou brasileira e o
toucinho não me representa. Sem mais.
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