O ano era o dos 50 e muitos. Não a década do século, mas a idade, aquela em que a mulher se agarra aos preenchimentos faciais, às massagens estéticas, às dietas insanas e à musculação alucinada, numa guerra muitas vezes inglória contra a gravidade. Contra a gravidade da situação, principalmente.
Já passara da metade da expectativa de vida de um ser humano (e quem quer chegar até os 100 anos?). Dali pra frente o que viesse era lucro. Porque o presente andava meio muxibento. O passado não menos sem graça. Ai, meu Deus, lá vem ela, a maldita crise existencial. Inferno.
Absorta nesses pensamentos sombrios, imersa em dúvidas sobre o futuro, Akash escorregou, quase caiu e ... thud! bateu com força na cabeça da pessoa que a amparara.
Ainda atordoada, viu apenas que era um homem, com certeza. Alto, sem dúvida. E forte. E de repente, zum!, ela o reconheceu. ‘Ele”!
Ator famoso de Hollywood, bonito, hot, rico e boa gente. Estava naquela meia-idade que cai tão bem em homens, que os fazem mais desejados que nunca. Nada de crise existencial para eles. Akash sempre fora louca por aquele homem, seu crush secreto. Se fosse adolescente, teria um pôster dele no quarto. Se vivessem no mesmo continente, iria a todas as premières, seria presidente de fã-clube. Quem era? Não posso revelar, mas ao longo da história digo quem poderia ser. O resto é com sua imaginação. Ou desejo.
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Você poderia estar no lugar de Akash e ter encontrado qualquer um desses. Eu não posso dizer quem foi. Mas você pode escolher um. Ou outro.
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Preocupado, e fazendo jus à fama de bom moço, Tom Cruise convidou-a para tomar alguma coisa no restaurante do hotel em frente - que, por essas coincidências da vida nas quais vocês não acreditam, mas existem sim – ele estava hospedado.
Um luxo! Uma construção clássica, restaurada e modernizada, escadarias largas, lustres de cristal, aquele cheiro de riqueza. Os empregados vestiam-se melhor do qualquer roupa que Akash tivesse em casa. Temeu ser expulsa como mendiga.
Estava com seu uniforme de turista, camiseta, legging, sapatilha, uma bolsa que já dera entrada no pedido de aposentadoria (se estivesse de pochete, pensou, me atirava debaixo de um trem e só saía dividida ao meio; uma metade ia para o inferno da vergonha, a outra morreria de novo).
Como miséria pouca é bobagem, o caminho do saguão ao restaurante era espelhado. Meu Deus, tá dando pra ver os fios brancos! Pelo reflexo, ela chegou a ver sua alma tentando sair e deixar o corpo passar vexame sozinho. Queria que um buraco abrisse e ela afundasse até o núcleo da Terra. Mas naquele tapete perfeito não teria nenhum buraco. Ao contrário da calcinha velha que ela estava usando e... por que diabos pensara em calcinha?
Akash tentava desesperadamente sentir em seu corpo algum resto do perfume que pusera pela manhã. Tentava lembrar se em sua bolsa havia uma escova de dentes, um batom, qualquer coisa.
O hotel era exclusivo para celebridades. Não havia gente pedindo selfies. Um famoso diretor cumprimentou-os e foi embora. Uma atriz vencedora do Oscar acenou de longe, discreta e simpática.
Brad Pitt puxou a cadeira. Pu-xou a ca-dei-ra. Um cavalheiro! Akash tremia de emoção. Só podia ser delírio! Ou pesadelo, pensou, ao olhar as unhas. Teve vontade de sentar em cima das mãos para escondê-las. Bem podia cair um lustre, uma lâmpada ao menos, em minha cabeça agora, para eu apagar e só acordar no pronto-socorro, de onde fugiria pra nunca mais ser vista.
Mas ela fugiu foi pro fundo dos olhos dele. Em filmes, é tanta maquiagem, filtros, que até Quasímodo fica bonito. Mas, pessoalmente, sem artifício algum, George Clooney era lindo. Exalava testosterona. Além de atencioso e divertido! O inglês de Akash nunca fora tão perfeito. Ele insistiu para que almoçassem.
Aquilo não podia estar acontecendo. Mas estava.
Akash mandou alguns zaps estratégicos para avisar que a bateria do celular estava acabando e que não havia onde carregar. E desligou. Se aquilo era um sonho, não haveria de ser a realidade que a acordaria.
Entardeceu. Anoiteceu. E eles continuavam conversando.
A essa altura Akash já havia embarcado na aventura. Ela nunca, absolutamente nunca, esperara encontrar Idriss Elba na rua. Muito menos passar uma tarde agradável e maravilhosa, só os dois. Muito menos, menos ainda, despertar o interesse dele. Logo nela, Akash, a comum, a classe média em extinção, cuja existência era ignorada pela humanidade, vestida como uma desabrigada? Bem, educada e culta ela até era.
Estava rolando um clima. Sem dúvida estava.
Subiriam para o quarto? Não. Claro que não. Já se divertira o suficiente. Voltaria para seu hotel com uma história inusitada que poderia contar às amigas e ao marido.
Conversavam normalmente, como se a ideia de subirem juntos fosse um guardanapo que caíra ao chão por acidente e colocado num canto sobre a mesa, esperando ser levado embora. Um gentleman, ela pensou. Nada de forçar a barra. Oferecera seu motorista para levá-la aonde e à hora que ela quisesse.
Foi quando seu diabo particular ou seu anjo da guarda, quem sabe ambos, trouxeram à sua mente algumas visões:
1. Akash, entre os lençóis da morte, só sentia o fel do arrependimento por ter perdido aquela oportunidade
2. Num bar, chorando com as amigas porque o marido a trocara por uma mulher mais nova. E ela abrira mão do Jeffrey Dean Morgan por causa do traidor.
3. O marido tendo a mesma oportunidade que ela, com, por exemplo, Scarlett Johanson, Catherina Zeta-Jones ou Salma Hayek. Sendo que ele aproveitou
Eis o que pode ter acontecido:
Um horror. O cara nunca tinha ouvido falar em preliminares. Seu ‘material de serviço’ era desapontador e ele não sabia fazer bom uso da ferramenta. Qualquer coelho seria mais lento que ele. O hálito era uma mistura de noites mal dormidas, estimulantes e álcool. A cueca, visível e olfativamente, não via água há tempos. Pediu para chamá-lo de fofinho da mamãe. Depois de tudo, virou de lado, dormiu e roncou. Um desastre. Bem feito. Quem mandou pecar.
Foi tudo perfeito. Preliminares e material de serviço na medida certa - e o sujeito sabia o que fazer com ele. Timing impecável, os dois ficaram satisfeitos. Todo ele era limpo e cheiroso. O único pedido ‘estranho’ foi perguntar do que Akash gostava, pois a noite era dela. Depois de tudo, a conversa foi ótima e depois da conversa ótima teve de tudo novamente e depois de tudo novamente teve conversa ótima e... Bem, não vou deixar ninguém com água na boca. Foi esplêndido. Que bom. Ela merecia isso.
Estou aqui pensando se digo o que aconteceu de verdade.
Digo.
Não digo.
Digo.
Não digo.
Ah, que se dane, não resisto. Foi maravilhoso. Pronto. #prontofalei.
Akash voltou para o hotel, feliz e viva como não se sentia há... quanto tempo mesmo? Não importava. Iria aproveitar ao máximo aquela sensação e deixar para responder depois a segunda grande questão do dia: contaria ao marido? You only live twice, one life for yourself, one for your dreams... cantarolou.
Eu sei o que aconteceu, mas não sou indiscreta.
George Clooney
Attribution
Comentários
Registro apenas que adorei o humor do texto, em um registro mais cômico do que a média histórica da autora.
Mas gostaria que alguém me explicasse um ponto: a Akash bateu na cabeça de quem a amparou, mas foi ela que teve alucinações?
Érica - isso seria possível se Akash nao tivesse, realmente, vivido essa aventura. Mas nao foi a escolha q ela fez. No entanto, vamos esperar que, dq por diante, o longa-metragem da vida dela seja bom o suficiente. Homem de Ferro, hein? Hummm, Tony Stark.
Marcio - como não rir de seus comentários? E sempre a gentileza embutida! Mas devo informar que ela nao delirou nao. Foi tudo verdade verdadeira.
Antonio Fernando - vc, como Marcio e lord black, naturalmente nao se viram retratados nessa história. Acho q vou fazer uma versão masculina hahaha. Vou dar seu conselho a Akash e depois te digo o que ela fez, se contou ou nao.
Anônimo - parabéns. Vc externou aqui o que uma porção de amigas me confidenciaram pelo zap kkkkkk
Alfonsina - vc e o Marcio me deram uma grande alegria, ao rirem da descrição das desventuras de Akash. Realmente, qd li seu texto da Juliana eu me ri por dentro, pq Akash já estava me contando a história dela. Sincronicidade! E não, repito, nao foi alucinação nao, foi tudo muito real.
Aninha - pois é, né? kkkk. Mas pode ser outra coisa, um esbarrão, por exemplo. E foi real, foi alucinação nao!
A todos, muito obrigada, como sempre. Vocês me deixam feliz.