LÁ — UMA CRÔNICA SOBRE O TEMPO
>> Cristiana Moura
Fim de tarde. Fizemos um castelo de areia. Assistíamos ao mar desfazendo nosso feito. Filmávamos. A mulher que há algum tempo nos mirava se aproximou com olhar e voz curiosos:
— O que vocês estão fazendo?
— Um vídeo- arte.
— Ah, vocês são estudantes de arte?
— Eu estudei artes visuais, aquele é meu filho que estuda música e a namorada dele que é dá comunicação.
Nem sei porque dei estas referencias acadêmicas, mas enfim, as dei.
— Filho? Quantos anos você tem?
— 43.
— Nossa, não parece. Eu quero chegar lá assim.
Lá? O tempo parou. O som do mar cessou. Eu fiquei ali, num tempo duradouro entre a inspiração e a expiração. Lá, como assim lá? Lá — advérbio de lugar que na afirmação da desconhecida designa tempo. O lá do futuro vindouro no qual ela quer chegar é aqui onde eu estou. Uma leve vertigem me tomou o corpo como se me perdesse entre o tempo passado e o que está por vir. Dar-me conta de estar neste tempo lá, me acordou dores no corpo que há dez ou quinze anos eram desconhecidas.
Entrei no mar como quem quer salvar-se de si mesmo. Talvez seja por isso que eu goste d’água. Ela me tira o peso do corpo. Divide comigo o peso dos anos vividos, das mágoas que não curei, daquilo que não vivi por medo. É um prazer leve que nem comer fruta na beira da estrada em viagem. O prazer não envelhece. Apenas muda. Nas carícias d'água ou das mãos o prazer vai ganhando delicadeza ao ser saboreado com o tempo, com a água de coco à beira-mar, com o chá de fim de tarde.
Sim, para terminar esta crônica preciso de um chá e um fim de tarde. Mal sentei-me e me pus a espreitar a conversa da mesa ao lado.
— Então ela me perguntou: a senhora ainda dirige? E no outro dia o Fulano também perguntou — A senhora ainda dirige?
Ela olhou para moça à sua frente e indagou:
— Tem uma lei que diz a idade de parar de dirigir.
— Não tia, não tem.
— O que vocês estão fazendo?
— Um vídeo- arte.
— Ah, vocês são estudantes de arte?
— Eu estudei artes visuais, aquele é meu filho que estuda música e a namorada dele que é dá comunicação.
Nem sei porque dei estas referencias acadêmicas, mas enfim, as dei.
— Filho? Quantos anos você tem?
— 43.
— Nossa, não parece. Eu quero chegar lá assim.
Lá? O tempo parou. O som do mar cessou. Eu fiquei ali, num tempo duradouro entre a inspiração e a expiração. Lá, como assim lá? Lá — advérbio de lugar que na afirmação da desconhecida designa tempo. O lá do futuro vindouro no qual ela quer chegar é aqui onde eu estou. Uma leve vertigem me tomou o corpo como se me perdesse entre o tempo passado e o que está por vir. Dar-me conta de estar neste tempo lá, me acordou dores no corpo que há dez ou quinze anos eram desconhecidas.
Entrei no mar como quem quer salvar-se de si mesmo. Talvez seja por isso que eu goste d’água. Ela me tira o peso do corpo. Divide comigo o peso dos anos vividos, das mágoas que não curei, daquilo que não vivi por medo. É um prazer leve que nem comer fruta na beira da estrada em viagem. O prazer não envelhece. Apenas muda. Nas carícias d'água ou das mãos o prazer vai ganhando delicadeza ao ser saboreado com o tempo, com a água de coco à beira-mar, com o chá de fim de tarde.
Sim, para terminar esta crônica preciso de um chá e um fim de tarde. Mal sentei-me e me pus a espreitar a conversa da mesa ao lado.
— Então ela me perguntou: a senhora ainda dirige? E no outro dia o Fulano também perguntou — A senhora ainda dirige?
Ela olhou para moça à sua frente e indagou:
— Tem uma lei que diz a idade de parar de dirigir.
— Não tia, não tem.
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