SOBRE FILAS, BEATAS E RESPEITO >> Mariana Scherma
Às
vezes é inevitável encarar uma fila e tudo bem, faz parte. Quando é preciso, eu
já me programo e saio mais cedo de casa pra não fazer a dança dos pezinhos
irritados. Porque uma coisa é certa: pior do que a fila em si é a galera ao
redor bufando e batendo o pé, como se estivesse descalça num asfalto a 100oC.
O problema é que nem sempre a vida da gente se encaixa nessa ordem quase
utópica de ter tempo pra tudo e aí...
Eu
só precisava trocar dinheiro pra pagar uma pessoa no trabalho e decidi dar uma
passada rápida no supermercado, que ficava no caminho. Tinha 20 minutos
cronometrados. Peguei duas humildes bananas e entrei na fila. O problema é que
o supermercado não colaborou comigo. Tinha apenas um (ãham, um!) caixa
funcionando e todo mundo estava na fila: eu, você, o fulano, o cicrano e, se
bobear, até o padre dos balões apareceu na fila. Eu era a última até que
apareceram também duas senhoras mais velhinhas (mas não era caixa preferencial,
então não cedi meu lugar).
O
problema é que faltava muuuita gente passar no caixa até chegar a minha vez e
comecei a olhar o relógio, que, obviamente, começou a trabalhar contra os meus
20 minutos cronometrados. Aí, meus pés começaram a fazer a dança do asfalto
quente, enquanto o cara da minha frente embalava meu ritmo com suas bufadas bem
bravas. Todos nós na fila nos olhávamos com aquela cara de cúmplices
indignados, vítimas de um supermercado que não estava com boa vontade em
relação a seus consumidores, menos as senhoras que estavam juntas atrás de mim,
que conversavam euforicamente sobre o Papa Francisco. Quis muito ser aposentada
nessa hora e achei até que sairia aposentada do supermercado, porque ôh fila
grande, minha gente!
Mas
aí veio a esperança: uma funcionária fez menção de abrir o caixa ao lado. Eu
estava preparada pra mudar de caixa no maior estilo Usain Bolt (e pouco me
importava se ia ou não queimar a largada, nessa hora já faltava menos de dez
minutos pra entrar no trabalho). Só que a funcionária voltou atrás e tive que
ouvir da senhora fã do Papa Francisco: “mocinha, se você fizer isso na próxima
vez, vai perder seu lugar”. Tentei explicar que precisava entrar no trabalho em
pouco tempo, mas a bondade da senhora não chegava aos pés do nosso novo Papa.
Nisso,
a amiga dessa senhora já foi pro outro caixa (naquele esquema, “quando chegar a
minha vez você vem pra cá”), que estava pra abrir. Eu fiz menção de mudar de
caixa e levei outra bronca da que ficou atrás de mim, que pode até estar na
melhor idade, mas enfrenta o pior humor do mundo. Aí juntei o meu tempo que já
estava esgotando, as bufadas nervosas que contaminam todo mundo e meus pés
cansados da dança do asfalto quente e respondi: “mas a amiga da senhora está
guardando lugar no outro caixa. É a mesma coisa que estou fazendo, só que vocês
estão em duas”. “Azar o seu”, a senhora fã do Papa me disse. É mole? Mas eu não
fiquei quieta, ah, não: “E sorte a sua, que vai herdar meu lugar na fila”,
respondi à mulher e ainda fiz uma ceninha ao colocar minhas bananas na cesta
dela.
Eu sei, a gente precisa respeitar os mais
velhos. E eu respeito. Sou muito amiga da minha vizinha de 80 anos, me divirto
com minha avó de 86, tenho vários amigos na academia que já passaram dos 70...
Mas respeito, que eu saiba, é uma rua de mão dupla. Não precisa passar dos 60
pra ser respeitado, foi o que minha mãe me ensinou. É por isso que eu tenho um
pé atrás com essas senhoras muito beatas, que praticamente usam camisetas “I
Love Papa Francisco” e detestam qualquer um que esteja na frente delas numa
fila. Sem generalizar, é claro.
P.S.:
eu ainda consegui trocar o dinheiro numa farmácia, mas fiquei pensando nas
bananas nanicas, que estavam tão apetitosas...
Comentários