UM DIA DA CAÇA - OUTRO, DO CAÇADOR
>> Zoraya Cesar
O ídolo dos amigos. O Papa-Todas, o Irresistível, o Pegador eram alguns dos epítetos do nosso protagonista de hoje. Vamos chamá-lo de Luizão, porque o nome verdadeiro é confidencial. Objeto de inveja dos amigos casados, que não tinham condições de viver vida tão excitante, e dos solteiros, que, por mais que tentassem, não chegavam nem perto do sucesso numérico de Luizão, que açulava essa inveja contando todos os detalhes sórdidos de suas aventuras.
Mas suas conquistas eram de qualidade, dizia. Não se dava ao trabalho de seduzir qualquer uma não, a graça, para ele, era fazer com que mesmo as mais astutas e experientes caíssem em sua teia. Aos quase 40 anos, solteirão convicto, jamais se apegara a qualquer das vítimas enganadas. Gabava-se de poder conquistar a mais empedernida ou séria que fosse, fazê-la se apaixonar perdidamente, para só então levá-la para a cama (ou carros, praias, escadarias de prédios comerciais, banheiros públicos ou privados... a cidade era cheia de opções) e descartá-la como de um lenço de papel assoado. Seu prazer era a conquista, a estratégia, as dificuldades e a vitória final, a entrega do corpo apaixonado da mosca, digo, moça, aos prazeres da carne. Um predador moderno: elegante e amoral.
Esclarecido o caráter de Luizão, não percamos tempo com análises ociosas. Vamos aos fatos.
Um dia – como costumo dizer, sempre tem “um dia” – Luizão chegou com os olhos brilhando de excitação (sei que é um chavão dos mais repetidos, mas não pude resistir): por intermédio de Maurício, um dos amigos de sempre, conhecera Ivonete, dona de salão de beleza, que estava de casamento marcado para dali a alguns meses, apaixonadíssima pelo noivo – assim mesmo, no superlativo. O alvo perfeito, babava. A estratégia aplicada para fazer Ivonete trair o noivo antes do matrimônio já estava preparada: far-se-ia (uau, uma mesóclise!) passar por coitado largado pela noiva no altar, mulheres adoram coitados.
E Luizão contava os avanços, os recuos, o lento mas gradual envolvimento de Ivanete, que agora aceitava um pouco menos recalcitrantemente os agrados e presentes de Luizão, ouvia-o emocionada falar da noiva ingrata, compadecia-se de seu falso sofrimento.
Até que Luizão anunciou, a boca cheia do riso canalha, que no dia seguinte ela iria à sua casa. E lá encontraria jantar romântico, velas, champagne (de Champagne mesmo, Luizão não economizava para alcançar seus intentos), presentes e, claro, declarações de amor e lençóis de linho. "Semana que vem eu conto", prometeu, "mais um capítulo da vitória da experiência sobre a virtude".
Na semana seguinte àquela que seria a noite memorável, Luizão não apareceu nem deu notícias. O celular só caía na caixa postal, seu perfil sumira das redes de relacionamentos. Os amigos chegaram a pensar que o noivo traído descobrira tudo e armara uma vingança. Maurício, no entanto, o único que não parecia preocupado, ao contrário, sorria misteriosamente, como se soubesse de alguma coisa muito engraçada e particular, tranquilizou a todos, afirmando que Luizão estava muito bem e que, no dia seguinte, iria encontrá-lo na hora do almoço.
Assim dito, assim feito. Maurício encontrou nosso protagonista sozinho, cabisbaixo, olhando para a comida sem tocá-la.
– E aí, amigão, você sumiu...
Luizão olhou para ele, com raiva, os olhos fundos, a pele baça.
– Você sabia, não é? Fez de propósito – respondeu, a voz sumida dentro da boca.
Mauricio riu.
– Que Ivanete era um travesti? Claro que sabia! – e ria de chorar. – Achei que seria engraçado um travesti enganar um garanhão experiente que nem você. Mas não se preocupe, ela é perfeita demais, engana todo mundo, eu também embarquei nessa – Mauricio agora gargalhava. – Não leve tão a sério, cara, faz parte da vida, é mais uma historia pra contar...
Luizão continuava de cabeça baixa, enquanto o outro falava e ria. Então, num movimento brusco e violento, agarrou Mauricio pelo colarinho:
– Imbecil, você estragou minha vida, vou te matar, estou apaixonado, entendeu? Apaixonado pela Ivanete. E ela me dispensou, não quer nada comigo – gritava em pleno restaurante, cuspindo raiva no rosto de um aparvalhado Mauricio, que começava a ficar ligeiramente azulado.
(Termino a história aqui, creio que não há mais nada a dizer. Conclusões, lições de moral, se a vida vingou-se de Luizão, se cada um tem o Maurício que merece, tudo fica a cargo do Leitor. Afinal o amor, quando acontece, é inexplicável, e sabemos nós que todo mingau tem seu dia de araruta. Mas, se você ficou curioso em saber o que aconteceu depois, é só perguntar, prometo que conto.).
Comentários
P.S essa história de digitar as palavras-chave do blog está cada vez mais complicado! pede para simplificar esse negócio!
muito bom! Faço coro com os pedidos de continuação da história.
Beijo.
O amor quando acontece pega desprevenido até quem se ache imune.
Ana