BREVIÁRIO >> Carla Dias


Repensa de fazer mágoa virar mar, invadindo o medo até brotarem solidões em ondas. Há quem acredite que cada solidão daquela lhe servirá de lição emocional e, depois do aprendizado, irá saboreá-las — e saberá, decerto, o que almeja.

"Decerto" não é condição que o frequenta.

Ainda deseja sabores que desconhece, ruas pelas quais nunca andou, histórias que chegam sem aviso: construção de casa para servir de cais do vazio; alimento matando a fome em horário de necessidade; pessoas se desfazendo de desculpas oriundas do cansaço de não entender o que seja, quem seja.

Observe esse mundo de revirar olhos e estômago.

Pode parecer, mas não se trata somente dele. Desfia incômodos, reconhecendo-se protagonista de enredos que se desdobram em infernos tidos como salutares, munidos de etiquetas complementares de fazerem da reflexão o avesso do autoconhecimento. Esconder-se sempre o agoniou; considera um perder-se em si para construir o sem volta. Só que gosta de voltar e, às vezes, isso o resgata de inexistir.

Ressente, mas de sentir intenso e repetido, de mascar chicletes até perder o gosto, feito quem folheia revista publicada há anos, mergulhada em esquecimento, confabulado com horas rejeitadoras de viço. É o dolente corroendo verdades frágeis, arremessando desculpas para minimizar conflitos internos inesgotáveis, e a fazê-lo pensar o tempo na crueza do que ele é: ponte para o enfim.

Dedica-se a manter os olhos abertos, para ver a banda e o tempo passarem, e jamais se distrair não somente de si — porque pouco importará se viver absorto no nada —, mas também de todos que em seu dentro encontraram espaço e lá permanecem.


carladias.com.br

Comentários

Carla, você é uma fotógrafa dos nossos interiores. 😉
Soraya Jordão disse…
que estratégia genial fazer mágoa virar mar.
Zoraya Cesar disse…
Pra ver a Banda passar cantando coisas de amor... em cada qual desencanto, em cada canto uma dor
Nadia Coldebella disse…
Desencantos todo mundo tem. Mas tem gente que se dedica a contempla-los de olhos e ouvidos fechados.

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