AOS AMIGOS >> Carla Dias >>
Pode parecer que não, porque damos sempre um jeito de nos conectarmos, porque gostamos da conversa compartilhada entre uma bebida - ao gosto do freguês - e outra, mas houve uma época em que nossas vidas não eram afetadas pela existência do outro.
Lembram de quando?
E somos meio vintage na conexão, apesar de a tecnologia nos manter mais próximos. Adoramos sala de estar; de nos encontrarmos nelas. Das longas conversas que acontecem ali.
Nem sempre a geografia ajuda ou o horário comercial possibilita. Às vezes, a tal da correria nos convoca para longos passeios. Daí que nos perdemos de vista por um período mais longo do que gostaríamos ou permitiríamos, caso tivéssemos o poder de ganhar na loteria e criar aquele lugar sobre o qual tanto falamos, onde seríamos quem desejássemos ser.
A vida segue acontecendo e nós insistimos em alguns sonhos que já acumulam décadas de planejamento e um buquê e meio de desapontamentos. Também apostamos na frescura do novo, porque somos atrevidos a esse ponto. Se há algo que a intimidade nos trouxe foi a capacidade de discordarmos sem que isso nos leve a nos perder de vez um do outro. À essa altura, já conquistamos a aptidão de permanecermos unidos, apesar de.
Enquanto o mundo enlouquece, gerando histórias que fazem nossas cabeças girarem, nossos espíritos envergarem; que nos conduzem em uma jornada em que se tornou impossível não lamentarmos, não sentirmos muito por sermos incapazes de ajudar a evitar isso, a consertar aquilo, a amparar alguns, teremos sempre um ao outro para não deixarmos a peteca cair. Nem sempre será delícia, tampouco agradável. Haverá dias em que os olhares passarão de raspão, diferente das tradicionais trocas. Porém, isso é porque somos humanos. Na hora do caos, da tristeza lancinante. Na hora da conquista pela qual se batalhou, da alegria divina. Na hora em que esquecemos dos entraves e nos abraçamos ao afeto, estaremos aqui um para o outro.
Haverá sempre café, vodca, chá. Haverá sempre salas de estar e espetáculos musicais. Haverá sempre uma história nova para contar. Uma velha história para enfeitar o salão das nossas memórias.
Gosto de pensar que a vida nos manterá conectados, mesmo sabendo que essa conexão depende de um trabalho dedicado e de presença. E apesar de ser a menos presente nos eventos de calendários, escolada em canos em casamento, batizado, festa de aniversário, aqui eu sempre estarei. Mas acho que essa é uma dúvida que não existe, não é mesmo? Porque, caso ela exista, bom, escrevo essa crônica para afirmar que não há dúvida. Apesar do meu jeito estranho de ser, e por ele mesmo, tirei o dia para dizer: estarei sempre aqui.
Aos amigos, meu agradecimento sincero por me permitirem fazer parte de suas biografias. E fiquem tranquilos, porque não, eu não escreverei um livro revelando todas aquelas informações embaraçosas que vocês já me confidenciaram.
Imagem: Artist Party © Peder Severin Kroyer
carladias.com
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