EFUSIVOS INCOMPREENDIDOS >> Fernanda Pinho
Já
li vários textos escritos por pessoas introspectivas, manifestando para o mundo
suas dificuldades e também as vantagens que encontram levando uma vida mais,
digamos, recolhida. Naturalmente, são textos excelentes posto que grande parte
das pessoas que desenvolvem a aptidão para escrever geralmente o fazem por
isso: porque são introspectivos e descobrem na escrita uma forma de se expressar.
Por
outro lado, dificilmente vejo alguém escrevendo alguma defesa às pessoas mais
expansivas e é isto o que me trouxe à crônica de hoje. Não estou negando minhas
origens nem nada. Sei que, num passado remoto, comecei a escrever – cartas,
diários e histórias – porque tinha uma certa preguiça de me relacionar de
outras formas com o mundo. Mas a preguiça passou, a genética entusiasmada falou
mais alto, pendurei meu casulo e hoje acho que faço parte do grupo que estou
chamando de efusivos incompreendidos.
Antes
de falar da incompreensão, porém, preciso falar dos nossos sofrimentos. Pode
parecer exagero usar a palavra “sofrimento”, mas sem exagero não há efusividade. Ficamos exageradamente
empolgados com qualquer coisa e por isso somos frequentemente vítimas do
famigerado balde de água fria. Você se
empolga para contar uma novidade para alguém, cria mil e um diálogos
imaginários para ajudar a deixar o momento mais emocionante. Você passa meses
planejando uma surpresa para alguém, praticamente tem que fazer um voto de
silêncio para segurar a língua e não estragar o próprio plano. Você passa numa loja
e vê um presente a cara de alguém, não pode comprar mas compra assim mesmo,
parcelado no cartão e tudo e mais. E quando chega o grande momento de entregar
a novidade/surpresa/presente para alguém, você ouve um: “ah, legal”.
Minha
nossa! Nada pode ser pior. Quer dizer. Pode. Você pode mandar uma mensagem via
Facebook, Whatsapp ou qualquer outro aplicativo de sua preferência cheia de
exclamações e carinhas e a pessoa responder com um econômico “rs”. Ou um frio e
calculista “ok”. E, sim, caros introspectivos, lendo os tantos textos sobre
vocês, já entendi que isso não quer dizer que vocês necessariamente estejam
indiferentes. Apenas são mais contidos em suas manifestações. Mas para nós que
ficamos saltitantes até quando encontramos uma moeda de 25 centavos perdida no
bolso de uma calça, é difícil de entender.
Assim
como muitas pessoas também não entendem por que nos entusiasmamos por tão pouco,
por que puxamos assuntos com qualquer um, por que sempre queremos participar da
conversa, por que enchemos nosso Facebook de fotos felizes. Não nos entendem e
às vezes nos julgam.
Acusam-nos
de forçados, na maioria das vezes: “Ninguém pode ser tão alegre assim logo
cedo”. Ué, eu posso, e daí? “Ninguém pode ser solícito desse jeito. Deve ter
alguma intenção por traz disso”. É por isso que o mundo não vai pra frente. Que
falta de fé na humanidade. “Ninguém é legal desse jeito. Essa mulher deve estar
a fim de mim”. Essa última frase dedico especialmente a uma grande amiga que é
muito mais efusiva que eu e, frequentemente, tem que dar explicações para algum
cara que confunde seu jeito “sou educada e sorridente e adoro dar abraços
apertados em todo mundo” com “estou apaixonada por você e por isso estou te
dando mole”. Ai, homens, sempre tão pretensiosos.
Também
percebo que existe uma tendência a supor equivocadamente que as pessoas mais
expansivas são desfavorecidas intelectualmente. Talvez por imaginarem que por
falar demais ou sorrir demais (para as fotos, de preferência) não temos tempo
de desenvolver nossa capacidade de observação e reflexão. Que nada, com a prática você aprende a falar,
sorrir, observar, refletir tudo ao mesmo tempo agora. E o que exige uma
análise mais profunda, reservo aos momentos em que estou sozinha. Quando estou
com gente, eu gosto é de interagir, sem a preocupação de fazer o estilo blasé
para parecer mais interessante.
Comentários
Há um tempo atrás eu era reservado demais. Ainda sou, por conta da minha timidez. Mas faz um tempo também que ando aprendendo a falar mais com os outros, interagir e tudo mais. Realmente ficar de cara fechada não é legal. Acho que todo mundo um dia deveria passar por esse processo.
"É tímido? Tudo bem, seja tímido. Isso vai fazer você ser mais reservado. Mas esforce-se e tente sorrir mais para as pessoas. Ficar o tempo todo preso em seus próprios pensamentos e suas próprias opiniões é burrice. Ouça mais. Opiniões alheias são importantes." Eu disse isso para mim mesmo um dia. E hoje, com um pouco do meu esforço, percebo a mudança.
Amei a crônica. Parabéns.