GRACIAS, ATACAMA >> Fernanda Pinho
Nunca tive um desejo particular por conhecer o Atacama até
vir morar no Chile, quando comecei a olhar com mais atenção para o sul gélido e
para o norte árido do país. A realização do desejo de subir ao deserto, no
entanto, só aconteceu há duas semanas.
Desembarcamos no aeroporto da cidade de Calama numa
sexta-feira, às oito da manhã, depois de duas horas de voo, saindo de
Santiago. De Calama, tomamos um transfer
até San Pedro de Atacama. No percurso de pouco mais de uma hora, apenas uma
sensação: a de que eu estava no meio do nada. De um lado e do outro da estrada,
apenas uma imensidão de um nada arenoso, vez ou outra interrompida por
geradores de energia eólica. Começou bem. Era exatamente o que eu esperava de
uma viagem ao deserto.
A chegada ao hotel foi uma grata surpresa. Além do local ser
encantador, fomos extremamente bem recebidos. O povo do norte do Chile nos
marcou com uma excelente primeira impressão, que ficou. Mas a viagem era curta.
E embora recarregar as energias também estivesse no plano, tínhamos que
aproveitar. Conhecer o povoado de San Pedro do Atacama era nossa primeira
missão. Missão que, dado o tamanho do povoado, poderia ser cumprida em dez
minutos. Mas correria era palavra proibida naquele fim de semana e havia muito
o que apreciar. As casinhas feitas de adobe, a igreja branquinha reluzindo no
cenário cor de terra, o vulcão Licancabur nos olhando lá de longe, os
cachorros, os tantos cachorros enormes e peludos que renderam à cidade o
simpático apelido de San Perro de Atacama. E o céu, outra imensidão que nos
engoliu. Nós, tão pouco acostumados a estar num local onde praticamente nenhuma
construção ultrapassa os três metros e meio de altura.
Nessa primeira volta de reconhecimento, almoçamos – sendo
que a fome foi o único critério para a escolha do restaurante – e fechamos um
pacote turístico para mais tarde: Valle de La Luna e Valle de la Muerte.
A chegada ao Valle de la Muerte é relativamente tranquila e
de assustadora só tem o nome. Para o Valle de la Luna já é um pouco mais
complicado. Ou talvez tenha sido complicado para nós, duas pessoas em estado atual de
sedentarismo e com 1.80 metro de altura. Desbravar os terrenos íngremes nem foi
o mais puxado. Difícil e inesperado foi
ter que passar pelas cavernas de sal que, em algumas partes, tem menos de um
metro de altura. Mas, olha, só me resta recorrer ao velho clichê: valeu a pena.
As paisagens que apreciamos nesses passeios são de outro mundo. Literalmente. O
Valle da Luna é o ambiente terrestre mais parecido com Marte e, por isso mesmo,
frequentemente utilizado pela Nasa para experimentos . Ali apreciamos o
espetáculo de cores do pôr-do-sol mais famoso do norte do Chile e voltamos para
San Pedro com aquela sensação plena de “será que eu mereço tudo isso mesmo?”.
Encerramos aquele primeiro dia apreciando uma saborosíssima
pizza feita em forno de barro, como não poderia deixar de ser. Por falar em
comida, ser mais criteriosos para o restaurante do almoço no dia seguinte
também estava entre os planos. Como estávamos com mais tempo livre na manhã de
sábado, caminhamos até encontrar um restaurante que combinasse com nosso estado
de espírito atual. Encontramos um de comida natural que nos convenceu,
inclusive, a voltar no dia seguinte.
Para a tarde de sábado, tínhamos agendado com a mesma
agência do dia anterior o programa mais esperado por mim: a Laguna Cejar. Eu
estava empolgadíssima com a possibilidade de flutuar na lagoa que tem altíssima
concentração de sal. Tanto que, mesmo a água sendo a mais gelada da vida, me
joguei. Me joguei na medida do possível, pois a gente flutua mesmo! Não
bastasse essa sensação ímpar e essa limpeza da alma, o cenário é deslumbrante.
Os tons de azul de todas as lagoas incluídas nesse passeio, entre lagoas doces
e salgadas, são de deixar até os mais brutos arrepiados. Para arrematar, um
brinde de pisco sour diante de mais um pôr-do-sol inesquecível. Mais chileno
impossível.
O fim da noite, porém, ainda reservava mais. Quando chegamos
de volta a San Pedro de Atacama – lembrando que todos os passeios ficam a poucos
quilômetros do povoado – a pequena cidade estava sem luz. O jeito foi jantar à
luz de uma bela fogueira escutando a psicodelia de um grupo local chamado
Cangrejos Ancestrales.
No domingo, já completamente relaxados, decidimos nos livrar
de horários e agências e desfrutar: da oportunidade de pedalar por uma
cidadezinha tão gostosa, da feirinha de artesanato local (sempre tem uma, para
minha alegria!), do nosso já eleito restaurante preferido da cidade e,
principalmente, do prazer de dividir uma experiência tão mágica com uma pessoa
que você ama. Gratidão eterna.
Mais fotos AQUI.
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