DESVESTIR-SE >> Carla Dias >>
De vazio desolador mesmo. Não é no aeroporto, observando filas e aviões decolarem. Não é de fechar as malas, a porta. É de fechar os olhos e assim mantê-los, e durante tanto tempo, que parece que fomos esquecidos em lugar nenhum.
Não é de adormecer e acordar sem presença. Não é de recorrer aos álbuns de fotografias para matar saudade com a lembrança provocada. Nem mesmo das festas que precedem a agonia da despedida.
Despedida que você não reconhece como despedida, que traz, na sua definição frágil de cotidiana, a devastadora transformação provocada por um gesto, uma palavra, uma falta.
Tudo se inflama, lateja, grita.
Percebe-se, então, mais do que o percebido antes dela, essa despedida que não permite a ausência. É feito ter de exorcizar demônios, mas sem a possibilidade de se desfazer deles, que continuam ali, morando em você.
Silenciosos, graves.
É de cair de amores pela figura exposta no quadro. Por aquele personagem que nunca lhe tocou, até que você o observasse mais de perto. Mais de perto é sempre risco. Mais de perto traz mil armadilhas nos braços. Mais de perto reverbera a intimidade do olhar.
Vai-se, então? Não... Parte de vez? Não...
De falta, apesar da presença. De altibaixos indecorosos. E de pequenas aventuras estimuladas pelo apreço, combinando catarses homeopáticas com conclusões indisponíveis.
A despedida de quem dá adeus, mas permanece. Um remanso falsificado. Uma mentira fazendo a vez de uma verdade.
Há distância em tantas instâncias. Há pausas de variadas durações.
Há despedidas repetidas à exaustão.
Imagem © Jan Mankes
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Abraços
Enio.