O CANDIDATO III >> Albir José Inácio da Silva
CONTINUAÇÃO DE:
O CANDIDATO I
O CANDIDATO II
— Vou bem, mas por minha conta e risco, e se dependesse de certas pessoas eu tava linchado e morto e enterrado porque eu sei muito bem que é naquela sua birosca que se inventam coisas contra mim. Até de crime já me acusaram, mas meu santo é muito forte e é preciso mais do que meia dúzia de fofoqueiros, desocupados e filhos de rapariga pra me derrubar — falou o pai-de-santo.
Adailton respirou fundo e se desmanchou em explicações. Muito pelo contrário, sempre defendia o Babalorixá dos maldosos comentários sobre sua transvialidade. Também nunca acreditou naquela história de roubo de bodes e galinhas que a maledicência teimava em divulgar. Sua avó fora do candomblé. Não vendia no seu estabelecimento artigos pras oferendas e artesanatos? Não mandava bebidas pras festas do terreiro? Vinha justamente colocar sua candidatura a serviço daquela casa, e era seu compromisso promover o respeito pelos cultos de matriz africana. Por que, Pai Tibúrcio, essas quatro pedras na mão?
Tibúrcio não queria falar, com medo de cadeia por calúnia já que não podia provar, mas tinha certeza que aquele salafrário ali na sua frente mais o outro, ladrão de gravata e bíblia na mão e dono da igreja milagrenta, tinham botado fogo de madrugada na sua cabana com todos os santos e guias, coisas de relíquia que vinham de sua avó. Quando acordou já não conseguiu salvar nada. Mas soube, por mais de uma pessoa, que o pastor cansou de dizer que Deus ia destruir com fogo a casa do diabo que era como chamava o terreiro. Falava isso nas igrejas e na loja de Adailton, que com tudo concordava. Agora vem com essa história de candidatura.
Estudaram-se em silêncio, remoendo cada um suas razões. Detestavam-se. Mas a venda em consignação de artigos religiosos e artesanato era interessante para ambos. Para o pai-de-santo, nesses dias difíceis, acabava sendo a única renda. Principalmente agora que a igreja milagrenta resolveu lhe fazer concorrência, copiando os descarregos, os passes e até as promessas de trazer em três dias a pessoa amada. Por seu lado, além da questão comercial, Adailton precisava de apoio político. Não era momento para brigas. E Pai Tibúrcio desafiou:
— Muita coisa tem que mudar, Seu Adailton, antes que este terreiro faça propaganda de vosmicê. Vamos ver como é que se comporta, daqui pra frente, esse defensor da liberdade religiosa!
Um quarteirão inteiro de mármore, vidro e aço. Era assim a nova sede da IMIV — Igreja Milagrenta Interplanetária dos Vivos, com guaritas nos quatro cantos e dúzias de empregados. Irritado com a revista, Adailton acompanhou o segurança até o gabinete do pastor. Pastor, Professor, Doutor, Bispo, Missionário e Apóstolo Habacuque de Tarso, que nesse momento gravava programas para rádio e televisão.
— Salve, reverendo, a paz seja convosco. Venho pessoalmente comunicar-lhe minha candidatura, em homenagem à parceria que sempre desenvolvemos no interesse dos nossos irmãos.
(Continua aqui.)
O CANDIDATO I
O CANDIDATO II
— Vou bem, mas por minha conta e risco, e se dependesse de certas pessoas eu tava linchado e morto e enterrado porque eu sei muito bem que é naquela sua birosca que se inventam coisas contra mim. Até de crime já me acusaram, mas meu santo é muito forte e é preciso mais do que meia dúzia de fofoqueiros, desocupados e filhos de rapariga pra me derrubar — falou o pai-de-santo.
Adailton respirou fundo e se desmanchou em explicações. Muito pelo contrário, sempre defendia o Babalorixá dos maldosos comentários sobre sua transvialidade. Também nunca acreditou naquela história de roubo de bodes e galinhas que a maledicência teimava em divulgar. Sua avó fora do candomblé. Não vendia no seu estabelecimento artigos pras oferendas e artesanatos? Não mandava bebidas pras festas do terreiro? Vinha justamente colocar sua candidatura a serviço daquela casa, e era seu compromisso promover o respeito pelos cultos de matriz africana. Por que, Pai Tibúrcio, essas quatro pedras na mão?
Tibúrcio não queria falar, com medo de cadeia por calúnia já que não podia provar, mas tinha certeza que aquele salafrário ali na sua frente mais o outro, ladrão de gravata e bíblia na mão e dono da igreja milagrenta, tinham botado fogo de madrugada na sua cabana com todos os santos e guias, coisas de relíquia que vinham de sua avó. Quando acordou já não conseguiu salvar nada. Mas soube, por mais de uma pessoa, que o pastor cansou de dizer que Deus ia destruir com fogo a casa do diabo que era como chamava o terreiro. Falava isso nas igrejas e na loja de Adailton, que com tudo concordava. Agora vem com essa história de candidatura.
Estudaram-se em silêncio, remoendo cada um suas razões. Detestavam-se. Mas a venda em consignação de artigos religiosos e artesanato era interessante para ambos. Para o pai-de-santo, nesses dias difíceis, acabava sendo a única renda. Principalmente agora que a igreja milagrenta resolveu lhe fazer concorrência, copiando os descarregos, os passes e até as promessas de trazer em três dias a pessoa amada. Por seu lado, além da questão comercial, Adailton precisava de apoio político. Não era momento para brigas. E Pai Tibúrcio desafiou:
— Muita coisa tem que mudar, Seu Adailton, antes que este terreiro faça propaganda de vosmicê. Vamos ver como é que se comporta, daqui pra frente, esse defensor da liberdade religiosa!
Um quarteirão inteiro de mármore, vidro e aço. Era assim a nova sede da IMIV — Igreja Milagrenta Interplanetária dos Vivos, com guaritas nos quatro cantos e dúzias de empregados. Irritado com a revista, Adailton acompanhou o segurança até o gabinete do pastor. Pastor, Professor, Doutor, Bispo, Missionário e Apóstolo Habacuque de Tarso, que nesse momento gravava programas para rádio e televisão.
— Salve, reverendo, a paz seja convosco. Venho pessoalmente comunicar-lhe minha candidatura, em homenagem à parceria que sempre desenvolvemos no interesse dos nossos irmãos.
(Continua aqui.)
Comentários
Obrigado pela edição, formatação, ou que nome tenha. Um dia aprendo.